Tambaba funciona 24 horas por dia

 

entrevista a Pedro Ribeiro*

 

foto: Pedro Ribeiro

Kléber e a esposa Juliana gerenciam a pousada e o bar da praia de Tambaba, onde também moram.

Joaquim Kléber, 47, casado, vice-presidente da SONATA (Sociedade Naturista de Tambaba). Paulista de nascimento, tem uma trajetória de cigano até parar na praia de Tambaba. É dono do bar, restaurante e pousada que funcionam dentro da praia. Mora na praia juntamente com a atual esposa, Juliana. Dos sete filhos, apenas um de seis anos de idade vive com ele, os outros, adultos, estão espalhados pelo Brasil. Fala ao OLHO NU sobre sua trajetória, hedonismo e roupas, regado a uma boa cerveja.

 

OLHO NU: Kléber, como foi que você veio parar em Tambaba ?

 

Joaquim Kléber: É um trajeto longo. Saí de São Paulo e fui para o Rio de Janeiro, trabalhei com informática e ingressei na polícia civil.

 

Tinha um veleiro e o sonho de dar volta ao mundo. Para realizar esse sonho era necessário ter um ponto de apoio. Eu e um parceiro resolvemos então possuir um bar na praia. Saímos do Rio de Janeiro e fomos para Porto Seguro, mas não deu certo. Então resolvi vir para esta região, contando com apoio de uma amiga que morava em João Pessoa.

 

Na época em que vim para cá, em final de 1989, iníco de 1990, o prefeito Aloísio Régis estava com o projeto de inaugurar a praia de naturismo e não encontrava parceiro prá tocar adiante. Aí juntou as duas coisas. O projeto do prefeito com a minha necessidade de dar a volta ao mundo de barco. Até então eu não tinha contato com o naturismo.

 

ON: Você nunca tinha ouvido falar em Naturismo antes ?

 

JK: Já tinha ouvido falar. Na época em que trabalhava com informática, fui uma vez até Florianópolis e soube da praia do Pinho, mas não cheguei a ir. Aqui eu joguei âncora. Não vou a nenhuma outra praia. Quando tenho que sair daqui para ir a João pessoa ou a Recife, para  buscar hóspedes, eu vou contrariado.

 

ON: Falando então um pouco sobre sua pousada. Quando eu estive aqui em 1999 somente havia seu bar e um projeto para a pousada. Hoje ela é realidade. Como foi isso ?

 

JK: A pousada e o restaurante estão construídos aqui sob concessão municipal. O terreno é da Marinha e recolho todos os impostos devidos. Mas quando comecei a construir tive problemas com a dona dos terrenos em torno da praia, são 400 lotes, pertencem a uma só pessoa, a Beatriz, que tinha o projeto de construir um hotel naturista. O prefeito, então me pediu para parar de construir a pousada até que ela começasse a fazer o hotel dela. A obra dela é orçada em dois milhões de dólares. O projeto também não foi prá frente, porque brigou com o marido. Hoje ela é minha amiga, vem aqui e desfruta da pousada e da praia. E eu concluí a construção. Ela é naturista convicta. Não vende os terrenos porque quer preservar essa área reservada ao naturismo.

 

Quando a pousada foi inaugurada, em 1995, não havia banheiro. A construção desses dois externos foi feito pelo estado. Mas a história para obter a permissão de fazê-los foi uma luta muito grande. Era considerado crime ambiental fazer banheiro. Eles só saíram por uma coincidência. Houve uma Feira Internacional de Turismo em João Pessoa, e o pessoal da PBTUR veio aqui em Tambaba, antes, para ver a infra estrutura porque queriam trazer participantes para cá. Convidei-os para comer camarão, carreguei no sal e tomaram muita cerveja. Daqui a pouco um deles pergunta onde é o banheiro. Eu apontei: a moita da direita é masculino, a moita da esquerda é feminino. Se for xixi, vai ligeiro. Se for cocô, espera que eu vou lhe dar o papel higiênico. Depois disso, na mesma semana vieram construir esses banheiros aqui. Eu os conservo até hoje. Mas depois eu consegui permissão para fazer diversos na pousada. O episódio alavancou tudo.

 

ON: Depois disso a praia começou a se desenvolver ?

 

JK: A praia teve uma evolução natural. Na primeira gestão do prefeito, que a inaugurou, foi uma beleza. Nas gestões seguintes, nós passamos por doze anos de repressão, com tentativas de derrubar a lei anterior na Câmara de Vereadores. Lutamos muito para impedir isso. Hoje quem está de novo à frente da prefeitura é o prefeito que a idealizou, que voltou depois de tanto tempo. No final do Mandato do prefeito anterior, alguma coisa já começo a mudar para melhor para nós. Graças a um jogo político do Damasceno, presidente atual da SONATA, que conseguiu juntar uma parceria com a prefeitura. Jogo que eu não tenho. Mantive dez anos de briga.

 

ON: Você mora aqui. Como é o relacionamento de sua família com o naturismo ?

 

JK: Minha esposa é naturista e meu filho mais novo, com seis anos, é o único que mora comigo. Tenho uma filha que mora aqui em Conde e outra que mora em João Pessoa. Um em Natal. Um é falecido. Os outros dois moram em outras regiões do Brasil. As duas meninas não praticam naturismo. Nem quando vêm aqui. Estão na adolescência e estão com as cabeças complicadas.

 

ON: Vi muitos policiais na praia. Este policiamento é constante ou foi designado apenas para o evento ?

 

JK: O grande número de policiais é só para este evento, porém temos policiamento constante. Ele se faz necessário por causa do grande número de visitantes que Tambaba recebe, inclusive turistas estrangeiros. Nem todo mundo que visita a praia é naturista, infelizmente. Esse policiamento que a gente tem conseguido manter, graças a Deus, tem salvado Tambaba dos erros cometidos em outras praias. Este ano tem chegado a notícia, que a praia do Pinho tem sido recuperada da turma do hedonismo. Que é o que a gente combate aqui direto. esse combate deveria haver em todas as outras áreas.

 

Há muitos hedonistas e casais swingers, que são uma praga, porque acabam denegrindo a imagem do Naturismo. Eles não precisam vir aqui, para praticar na praia essas coisas, já que eles contam com uma série de locais onde eles podem realizar suas fantasias. Que doença é essa que precisa se exibir, fazer sexo em locais públicos com gente olhando ? Eu acho que essa turma do hedonismo tem que ser banida das áreas de naturismo.

 

É por isso que temos essa guarda uniformizada, que fica pela mata. Temos um outro problema que é o vouyer, o punheteiro, aqui a gente chama de urubu de pedra. Ele traz água congelada de casa, traz lanche, se esconde na mata, fica lá o dia inteiro tocando punheta, não sei como pode. Então a guarda vai, pega a roupa e ele tem que voltar pelado para casa. Mas o punheteiro só vem porque há o casal que quer trepar na praia, dar um show para ele, às vezes chama para participar. Se acabasse esse negócio do hedonismo, seria uma bênção para o naturismo. Haveria mais criança na praia.

 

ON: Bem, mudando um pouco de assunto, vem a questão dos garçons e atendentes estarem usando roupas na área naturista.

 

foto: Pedro Ribeiro

Em frente ao bar e por boa extensão da praia, estão espalhadas mesas, cadeiras e cabanas para que os vistantes tenham serviço.

JK: A Vigilância Sanitária exigiu que fosse assim. Eu acho que eles têm razão. Olha a altura das mesas. Estão na mesma altura da genitália. Por mais que você seja naturista, não é muito correto o cara debruçar assim na sua mesa.

 

ON: Não haveria outras soluções, como uso de avental, por exemplo ?

 

JK: Aí cai numa questão, que eu não sei nem como colocar da forma verbalmente correta. Queira ou não queira, os garçons no Brasil, geralmente pertencem a uma classe socioeconômica menor. Chamar para trabalhar aqui, já é um problema. Colocar ele sem roupa vai ser outro nó. Imagina uma cidade pequena. A mão de obra vem toda de um vilarejo mais próximo, paraibano nativo, o cara não tira a roupa nem por um cacete. A cozinheira é evangélica. Ela ora todo dia para vir trabalhar aqui, que ela depende do dinheiro que recebe por semana, mais café, almoço e janta. Ela não pode perder esse emprego, porque a região não oferece outro. E eu não posso perdê-la.

 

ON: O problema é ter os garçons usando sunga. Pois parecem banhistas de uma praia comum. Na cozinha é local fechado e entende-se perfeitamente a necessidade de roupas.

 

JK: Seria bom criar um uniforme padronizado.

 

ON: O que você espera para o futuro da praia de Tambaba ?

 

JK: Sem demagogia, sem prepotência, mas puxando a sardinha também... Tambaba hoje, pelo relato de usuários de outras áreas, é candidata a sediar o Congresso Internacional. Damasceno está fazendo parte da Federação. Está muito cotada. Tambaba é uma coisa que não para. Tomara que as outras áreas copiem esse trabalho. O fundamental, isso eu reitero, é acabar com o hedonismo. Eu recebo muito europeu e eles combatem também o hedonismo. Quando estão aqui ajudam a combater esse comportamento. Então a gente vai conseguir praticar o naturismo, não essa putaria que meia dúzia quer fazer.

 

Veja hoje na praia. Umas duzentas pessoas. Tem uns dez ou quinze safados. Se a gente conseguir eliminar esse pessoa... Dentro do segmento de turismo, o naturismo é o que cresce mais. É um absurdo como ele cresce. A tendência é crescer ainda mais e vai ficando cada vez mais natural, de verdade. Acho que Tambaba está sendo o carro chefe dessa história.

Jornal Olho nu - edição N°62 - novembro de 2005 - Ano VI


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