Galheta, a luta perpétua
pelo naturismo e pelo meio-ambiente
entrevista a Pedro
Ribeiro*
foto: Pedro Ribeiro |
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Miriam e Affonso Alles, juntamente com o pessoal de Santa Catarina,
presentes no passeio de Catamarã pelo rio Paraíba. |
Affonso Alles, 72 e Míriam
Alles, 63, são o casal que veio da Praia da Galheta, em Florianópolis,
especialmente para o Encontro. Ele é o atual presidente da AGAL. Viajam o
mundo inteiro visitando áreas naturistas e sempre compartilham com os
leitores do OLHO NU essas experiências. Concederam essa entrevista minutos
antes de embarcarmos para o ansiado passeio de catamarã promovido pelo
jovem grupo NU de João Pessoa.
OLHO NU:
Há quanto tempo vocês estão á frente do movimento naturista na praia da
Galheta ?
Affonso Alles:
Desde 1990. Já tem quinze
anos.
ON:
Vocês são os precursores da praia da Galheta, não é ? Vocês foram os que
brigaram para que a praia da Galheta existisse ?
AA:
O nudismo era praticado lá muito antes da transformação da praia em
oficial. Muito antes de qualquer autorização e sempre sujeito a algum
problema.
ON:
Vocês já a frequentavam antes ?
AA:
A praia somente foi oficializada em 1997 e nós a frequentávamos desde 90.
Foi uma luta de sete anos. Realmente o encaminhamento para oficializar
passou a ter chances depois de uma agressão violenta que sofri na praia.
No mesmo dia em que o cara
me pegou com bordoadas de capoeira, o pessoal disse que "agora nós
estávamos com tudo". Foi tão flagrante, tão violento, que até mesmo os
agressores reconheceram que deram um fora. Ele saiu correndo e foi
procurar imediatamente seu patrão e avisar pra ele que havia feito
besteira: "agredi um doutor".
O problema que ocorreu na
época, e ainda ocorre, é a especulação imobiliária. O naturismo representa
um perigo para quem quer transformar aquela área tombada em loteamento
para construção de moradias de luxo.
ON:
Como é o funcionamento da praia da Galheta ? Algo deve mudar ou está bom
como está ?
Miriam Alles:
Perfeito não está porque em um ambiente livre, onde qualquer pessoa pode
entrar, e pelo fato de haver pessoas desnudas, sempre vêm aqueles caras
que tem a finalidade de olhar, para ficar perto. Isso incomoda algumas
pessoas, que não sabem lidar com a situação ainda. A gente já aprendeu. Já
debatemos e conversamos muito, tivemos reuniões sobre o tema.
ON:
De que forma vocês lidam com
isso ?
MA:
Indo lá e chamando a atenção
da criatura: "Oh, cara, aqui não é teu lugar" ou as mulheres também pedem
para ele se afastar. A praia é grande, pode ir para qualquer outro lugar.
Nada de violência. Alguns homens da associação já queriam partir para a
violência, bater. Mas a gente sempre apaziguando, pois a violência é
contra os princípios do naturismo. A gente vê como um processo educacional
mesmo. Alguns protestam por nossa atiude branda. É a mesma coisa que a
criança, é uma curiosidade infantil.
ON:
Bem, uma coisa é apenas olhar. Ma há pessoas que vão além disso e têm
atidudes que podem parecer agressivas...
AA:
Quanto a esses comportamentos mais inconvenientes, o cara que se masturba
ostensivamente, são figuras que também aparecem de vez em quando. A gente
também sabe que eles também são vítimas de um processo educacional
completamente deturpado, em relação ao corpo e ao respeito. A gente vai lá
e conversa. Diz pra ele que isso é atitude para dentro de casa.
Nosso recurso é somente a
conversa, porque policiamento é praticamente zero. Eventualmente passa um
par de guarda-vidas pela praia ou de jet-ski pelo mar.
MA: Esse é um grande
problema. Não temos guarda-vidas nem policiamento na praia. pedimos
todos os anos, mas o estado não manda.
ON:
A Associação não tem condições, por exemplo de contratar um segurança para
a praia ?
foto: Pedro Ribeiro |
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Miriam e Affonso, nas extremidades, se juntam à concentração de
Reynaldo e Julíndio |
MA:
Não temos dinheiro. Nossa arrecadação é muito pequena.
AA: Para este ano, o
Secretário de Turismo prometeu apoio junto às instâncias diversas para
colocar segurança lá. E esse necessidade de segurança é importante não só
pelo comportamento do público em relação ao naturismo, mas por causa da
invasão da vegetação, porque é área de preservação ambiental integral.
Não é permitido sair da trilha oficial. Muitos caminham pela mata para
fazer programinhas... Nós, os frequentadores, não temos condições de
coibir isso, nem de ir atrás deles, senão estaríamos nós cometendo um
crime, que seria o de pisar na vegetação.
MA: E nem seria nosso papel.
Já pedimos também a demarcação do parque, mas até hoje a prefeitura tambem
não fez. Se é feita a demarcação, terá que haver guarda florestal e essa
coisa toda, para orientar.
O problema que está lá nos
ameaçando de novo, é que um vereador entrou com um projeto de derrubar a
lei do naturismo. No final do ano, deveremos ir à Câmara Municipal, para
uma audiência pública e vamos pedir apoio a todas as associações.
AA: Precisamos fazer uma
campanha que mostre que o naturismo ajudou a preservar o parque até agora.
Se não estivéssemos lá, com certeza já haveria construções ilegais. Já
estaria todo tomado. Então em vez de partirmos para a defesa, vamos para o
ataque, para mostrar ao público o nosso trabalho.
ON:
Apesar desses problemas e por causa deles, como é que você vê o futuro da
Galheta ?
AA:
Para o próximo verão, a Miriam vai oferecer sistematicamente massagem na
praia. Teremos também uma fisioterapeuta dirigindo trabalhos de
alongamento. Aos s'bados e domingos vamos oferecer esses trabalhos.
ON:
Em média, quantas pessoas frequentam a Galheta durante os sábados e
domingos de verão ?
AA:
Oscila muito. Às vezes tem 10, às vezes tem 30. Eu diria que dificilmente
a frequencia de naturistas passa de 50 pessoas.
ON:
Como você está vendo este Encontro Naturista ? Que importância ele poderá
ter para a Galheta ?
AA:
Todos os Encontros têm gerado motivação permanente para que possamos
continuar nessa luta pelo naturismo. Isso é muito saudável e importante
para a vida no planeta. Este Evento não fugiu à regra.
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