Abricó visita Tambaba

 

entrevista a André Herdy*

 

foto: André Herdy

Pedro Ribeiro é presidente da Associação Naturista de Abricó.

Pedro Ribeiro, 47, solteiro, professor, é presidente da ANA - Associação Naturista de Abricó, a praia naturista do Rio de Janeiro, que sofreu proibição por anos seguidos até ser definitivamente liberada em 2003. Também o editor do jornal OLHO NU. Ele fala sobre a praia do Abricó, o Encontro Naturista e a praia de Tambaba.

 

OLHO NU: Como está a praia de Abricó atualmente ?

 

Pedro Ribeiro: Depois de nove anos de proibição por liminares judiciais, a praia do Abricó está funcionando normalmente como praia naturista há dois anos. Aliás neste mês de outubro comemoramos exatamente os dois anos de liberação. Os anos de proibição acabaram por prejudicar o bom funcionamento da praia inicialmente. A realidade em 1994 era um pouco diferente. Grumari, onde está localizada Abricó, era um pouco menos frequentada. Hoje há uma super lotação nos finais de semana de sol forte, que prejudica o ir e vir das pessoas.

 

Também a repercussão da proibição despertou uma curiosidade muito grande das pessoas não naturistas. Quando a praia foi finalmente liberada, tínhamos que lidar com essa massa de curiosos. aos pouquinhos fomos implementados determinadas medidas que reorganizaram a praia. Posso dizer, sem dúvida, que é a praia naturista brasileira mais democrática, pois não faz discriminações quanto à presença de homens solteiros. Isso acabou atraindo jovens, que é muito bom para o naturismo.

 

Mas tudo tem lado negativo. O número de mulheres é pequeno em relação ao número de homens, embora tenhamos mais mulheres que muitas praias naturistas onde somente entram casais.

 

ON: Como funciona a ANA ?

 

PR: A Associação naturista de Abricó é a instituição que cuida dos interesses dos frequentadores da praia do Abricó. É ela que tem acesso às autoridades e à imprensa em geral. Ela zela pelo bom funcionamento e organização da praia. Nem todo mundo que frequenta a praia do Abricó é membro da Associação, mas todo membro ama de paixão a praia e faz questão de colaborar e dar seu suor para que a praia funcione.

 

ON: Pode-se dizer que a praia do Abricó, hoje em dia, tem funcionamento perfeito ?

 

PR: Lógico que não. Além do mais eu não acredito na perfeição. A ANA somente está presente na praia aos sábados, domingos e feriados, de sol. Nestes dias é que há organização e vigilância. Por enquanto ainda não temos condições de estender pelos outros dias da semana.

 

ON: Quantos associados há atualmente?

 

PR: Cadastrados temos exatamente 238 membros. Efetivamente pagando cerca de 50. Mas a frequência na praia é muito maior. Chegamos a 300 pessoas por dia de final de semana, no verão.

 

ON: Quais são os planos para o futuro ?

 

PR: Aos poucos pretendemos consolidar a praia do Abricó como marco naturista. De modo prático, vamos cada vez mais promover atividades de integração entre os frequentadores, independentemente de serem associados, para que se tornem uma grande família e iniba a presença de pessoas com comportamento indesejáveis.

 

ON: O que você achou do V Encontro Nacional de Naturismo ?

 

PR: Achei fantástico, pela possibilidade de reunir em um só lugar as cabeças pensantes do naturismo brasileiro. É muito bom para trocar ideias e experiências. Isso faz crescer o naturismo. No entanto, algumas falhas na organização precisam ser corrigidas. É preciso realmente cumprir a pauta. Não se podem deixar as coisas parecerem que foram feitas nas coxas. O pior é que não foram. Logo, essa sensação é muito ruim.

 

Por outro lado, a hospedagem funcionou perfeitamente, o apoio político deu condições de deslocamento bem a contento. Algumas palestras foram muito interessantes, principalmente a da abertura. Acho que precisa de um coordenador central para que as coisas não degringolem.

 

foto: Fábio de Minas

Representantes da praia do Abricó partciparam ativamente dos trabalhos do V Encontro Nacional de Naturismo

ON: E da praia de Tambaba, alguma queixa ?

 

PR: Dizer que Tambaba é o paraíso é confirmar o senso comum. Se não é, está bem próximo. Principalmente no que se refere a sua paisagem exuberante. Sei que cada área naturista tem seus problemas e sabe onde o sapato aperta o pé. Mas, como disse antes, eu prefiro que as praias sejam mais democráticas no seu acesso, porém exigindo-se o cumprimento integral da ética naturista.

 

Não sou partidário da exclusão de homens desacompanhados de mulheres, porque acho discriminatório. Na praia do Abricó, notamos que homens desacompanhados de mulheres, que dão problemas na praia, são exceções. No entanto temos casais que quebram a ética naturista e, em menor número, mulheres que também fazem isso. Mas, como no caso dos homens, todos os casos são exceção e não regra. Então por que discriminar ?

 

ON: Quando você começou no naturismo ?

 

PR: Eu desde adolescente procurava lugares mais desertos para praticar nudismo. Subia morros e chegava em praias escondidas. Tirava a roupa e passava lá o dia inteiro, na maior parte das vezes sozinho, sem qualquer companhia. Parecia um eremita. Aos poucos fui sentindo falta de companhia e ficar sozinho começou a me incomodar. Comecei a procurar lugares menos desertos, aumentando inclusive meu risco de ser agredido. Ficava nu, mas quando alguém se aproximava eu me vestia. E a pessoa que chegava também não tirava a roupa. Com o tempo fui tomando coragem e não me vestia mais com a aproximação e, surpresa, as pessoas ficavam por perto e pareciam não se incomodar. Algumas até arriscavam também a tirar as roupas. Aos poucos fui conhecendo essas pessoas e vi que elas também tinham anseios parecidos com os meus. Considero este momento o começo do meu naturismo. Isso ocorreu em torno de 1985.

 

Logo depois ouvi falar da praia do Pinho, mas não tinha condições de ir até lá. Comecei a frequentar a praia do Abricó, ainda clandestinamente, mas já havia pequenos grupos de pessoas que também iam lá para fazer nudismo. Aos poucos a ideia de oficializar a praia como nudista foi ganhando força.

 

Neste intervalo ouvi falar da fundação da RIO-NAt, que tinha como regra somente aceitar casal, o que me excluía. Logo depois, a inauguração da praia Brava  em Cabo Frio, me fez deslocar até lá e ter o primeiro contato com os naturistas cariocas. Esse primeiro contato não foi amigável, pois protestei veementemente contra a separação de solteiros e casais. Mas aos poucos, de tanto ir à praia Brava, fui fazendo amizade com pessoas associadas, embora continuasse excluído da área de casais. Até que me convidaram para um Encontro em um clube da RIO-Nat, no Rio de Janeiro. Foi meu primeiro contato com o naturismo organizado, em 1991, de maneira sofrida. Desculpe-me por ter me estendido tanto.

 

ON: Sem problemas. É verdade que foi você o idealizador da Lei Gabeira ?

 

PR: Bem, a ideia de que precisávamos  uma lei federal que protegesse o naturismo era comum a várias cabeças pensantes dentro do naturismo brasileiro. Nesta época eu já tinha conseguido a aprovação da Resolução municipal que instituía o naturismo na praia do Abricó, mas uma liminar judicial proibia a prática. Eu e Sérgio de Oliveira criamos um projeto que deveria ser apresentado a um político que o quisesse defender na Câmara ou Senado.

 

A ideia de procurar o Gabeira foi minha, porque ele era do mesmo partido do Alfredo Sirkis, autor da Resolução do Abricó. Eu sabia que toda sexta-feira, Gabeira fazia uma audiência pública na rua São José, no centro do Rio. Então fui para lá esperá-lo, sem saber qual seria sua reação. Ele chega, com um banquinho, e sobe nele e começa a chamar as pessoas que quisessem reivindicar alguma coisa. Aproveitei e falei com ele. Entreguei a cópia do projeto. Ele leu e disse que daria resposta. Dias depois, ligou e pediu que eu passasse em seu escritório. Ele havia encampado a ideia, mas iria modificar a forma para se adequar às exigências da Câmara. Dois meses depois surgiu o projeto de lei que foi aprovado. Isso aconteceu em 1995.

Jornal Olho nu - edição N°62 - novembro de 2005 - Ano VI


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