Naturalmente.
Como proceder no nosso meio social e profissional quanto à nossa
própria nudez?
Por Paulo Pereira
Julho de 2009
Neste inverno carioca, com noites e madrugadas deliciosamente frias
(para muitos), volto a consultar meus preciosos alfarrábios. Seleciono,
então, duas matérias oportunas. A primeira, mais recente, publicada pela
conceituada revista naturista francesa “La Vie Au Soleil” (n° 88, jan/fev
de 2002), sob o título de “Como apresentar o nosso naturismo em nosso
meio social e familiar”, escrita por Laurence Tanet, a segunda, escrita
em 1953, por André M. Poznanski para a famosa revista “Saúde e Nudismo”,
Rio de Janeiro.
Com temperaturas mais amenas, parece haver um convite
lúcido à meditação, à reflexão mais tranqüila, precisamente quando a FBrN apresenta seus novos presidente e vice-presidente, respectivamente
José Antonio Tannús e Jorge Bandeira. É indispensável considerar os
postulados histórico-filosóficos do Movimento, desde Ungewitter, para
que evitemos, unidos fraternalmente, os sonhos delirantes, as utopias e
as meias verdades, além dos improvisos. Lembremos que a vida é um
processo de equilíbrio dinâmico e que a natureza não dá saltos...
Em síntese rigorosa, o que nos diz Tanet no seu artigo para “La Vie Au
Soleil”? Como devemos mencionar nossa prática naturista? De início, o
autor salienta a importância de agirmos com boa descrição, com sábia
diplomacia. Afinal, a nudez ainda pode (e costuma) suscitar preconceitos
e inquietações, além do fato de nós, naturistas, constituirmos uma
efetiva minoria (embora significativa) em relação a sociedade vestida.
A
nudez, como “problema”, não configura nenhuma novidade, infelizmente.
Lembro aqui o que escrevi em “Corpos Nus, Verdade Natural – 2006” a
respeito do propalado “problema da nudez”. Repito, inclusive, o que
afirmei nas páginas da revista “Brasil Naturista” (“Coluna “Perfil”):
francamente não é nova a questão da nudez como problema, inclusive por
parte de alguns deslumbrados que se consideram naturistas, mas é
necessário, como nunca, enfatizar a pergunta que não quer calar, ou
seja: o nu assusta e incomoda? Até quando vamos nos submeter aos
caprichos dos dogmas puritanos, prestigiando lendas e tabus criados pela
ignorância e pela falta de escrúpulos dos ávidos do poder?...
Tanet
ressalta, com sabedoria, o valor da prudência, que deve ser exercitada
pelos bons naturistas. Parece-me razoável, não esquecendo nunca de que o
bom exemplo é o melhor convencimento. Mas uma boa pitada de coragem
consciente pode sempre ajudar, sobretudo, porque afinal ninguém até hoje
nasceu com roupas... Tanet pergunta como devemos agir perante nossos
amigos, com as pessoas de nossa confiança. Como proceder no nosso meio
profissional? Como convencer os outros? Sabemos todos, observa o autor
francês, que a nudez representa, ainda agora no século 21, um assunto
tido como tabu, associado diretamente à sexualidade, ao exibicionismo e
até à pornografia...
Enfatizo, uma vez mais, que o bom exemplo é a melhor resposta. Verdade e
simplicidade. Reafirmo aqui o que nos diz brilhantemente o notável
sociólogo (educador) inglês William Welby: “É apenas natural, a
filosofia do nudismo”, título de seu excelente livro, Thorsons
Publishers, Londres. Não se trata, pois, propriamente de mera
transgressão, mas sim de uma afirmação do natural, do que a natureza
impõe.
Sexo e nudez não são sinônimos de pecado, de doença ou de
imoralidade. Basta de obscurantismo! Tenho sempre colocado claramente
que o ser humano faz parte da natureza, da biodiversidade, primata que
é; o ser humano não é um anjo barroco para enfeitar os tetos dos
templos... Como observa Tanet, todos nós temos nossos limites, que devem
ser considerados, no prestígio da convivência democrática, sem exageros
e sem disparates. Parece-me precioso sublinhar, além do bom exemplo, o
valor fundamental da informação, da informação pertinente, da informação
científica, em lugar de palpites, de pseudociência e de crendices
medievais. Combater a estranha preguiça de ler, e de estudar, eis uma
tarefa urgente, especialmente entre nós brasileiros. O naturismo, que é
centenário, nunca viveu conscientemente de lendas ou preconceitos, mas
sim da atuação corajosa de uma plêiade de ilustres batalhadores. Devemos
desconsiderar as utopias. A difusão da boa leitura é um caminho
importante para o esclarecimento a respeito da prática naturista, sempre
com referência histórica.
O artigo de Poznanski, publicado em “Saúde e Nudismo – 1953” tece
interessantes considerações sobre a prática nudista-naturista, ainda
válidas nos dias de hoje, o que pode demonstrar que o bicho-homem
continua fiel as suas raízes e interesses, sempre inquietante. Vou
direto ao assunto e cito Poznanski: - “Para muitas pessoas, o termo
nudista (ou naturista) significa maníacos, cujas espécies variam segundo
as tendências do espírito humano. Para alguns, o nudista é um
hipersexuado; para outros, um hiposexuado. Há pessoas que o tomam por
adorador do sol e outros olham-no como escravo de potências tenebrosas.
Às vezes, o imaginam como certa espécie de eremita anacrônico, na
sociedade moderna, preocupado com a plástica do corpo e alimentando-se
de ervas. Há, por fim, pessoas que têm a certeza de que o nudista, ou
naturista, é um gozador sensual.
Todos têm razão sobre certo ponto de
vista”. Naturismo, é bom que fique bem claro, não é ideologia; naturismo
é forma de comportamento ou até filosofia de vida. O naturista é apenas
natural, um ser humano natural. Sem o exercício da sexualidade, por
exemplo, não haveria vida, multiplicação da espécie humana, em
princípio, naturalmente. É mister não delirar jamais. O grande problema,
sobretudo, é que comumente temos a tendência de complicar o simples, de
criar dificuldades para melhor vender facilidades. É tempo de acordar.
Finalizo reproduzindo o que eu disse na edição n° 9 de “Brasil
Naturista”: a longa saga naturista, no Brasil (desde 1949) e no mundo
(desde Ungewitter), tem sido escrita pelos fatos, pela coragem, pela
autenticidade, pelo não preconceito. O resto é papo de idiota. Em lugar
de transbordamentos e de eventual culto à personalidade, um pouco mais
de racionalidade e de respeito às raízes históricas do naturismo não
faria mal algum. Repito: o naturismo merece respeito. E acrescento:
muito respeito, com busca lúcida pelo auto-conhecimento de cada um,
longe dos casuísmos e dos oportunismos baratos.
Paulo Pereira
*Biólogo,
escritor, ex-presidente da Rio-NAT
indiangy99@yahoo.co.uk
(enviado
em 26/06/09) |
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