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Jornal Olho nu - edição N°106 - setembro de 2009 - Ano X |
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Naturalmente – Setembro de 2009 por Paulo Pereira*
Vem chegando novamente a primavera, tempo do verde renovado, das flores, dos dias progressivamente mais claros, mais quentes... A vida, em tom maior, reafirma-se sem precisar de mais pretextos. A natureza mostra a beleza com simplicidade e nos convida à plenitude, ao encontro da verdade da existência. E a boa prática nudista-naturista se faz meio eficaz de integração e alegria. Mas sem enganos de encomenda.
Em contato mais íntimo e lúcido com o natural, sobretudo, fica mais fácil entender a importância do autoconhecimento e do respeito à realidade. A natureza não quer as máscaras, as meias verdades ou o cinismo que busca negar os fatos. A hipocrisia e os preconceitos são, pois, inaturais e, de resto, odiosos. Os naturistas autênticos não podem cultivar os pretextos.
É oportuno salientar aqui e agora que são infelizmente numerosos os exemplos de indivíduos que fazem do naturismo um mero pretexto, uma quase desculpa conveniente para seus transbordamentos e oportunismos. De longa data, tenho mencionado os desencontros e os disparates de alguns desavisados. Quando alguém, inadvertidamente ou não, usa a prática nudista-naturista como simples meio de atingir os seus objetivos pouco elogiáveis certamente cria um enorme prejuízo para a causa naturista, pois faz dúbios (ou equivocados) os princípios e finalidades do Movimento.
A teimosia pouco inteligente de praticar o topless (ou bottomless), por exemplo, nos espaços consagrados ao naturismo, é uma das formas freqüentes de descaminho. Isso sem falar no consumo exagerado de fumo e bebidas alcoólicas (ou outras drogas perigosas)... Igualmente, as atitudes inconvenientes (de caráter sexual ou não) em relação aos presentes nos vários ambientes naturistas também são dignas de desaprovação. Dirão alguns que nada disso é novidade e que não adianta chover no molhado. Mas não podemos fugir da realidade fazendo de conta que está tudo bem... Ficar nu simplesmente não configura prática naturista, lembremos uma vez mais. Por tudo isso, considero de grande valor o prestígio da presença das famílias nos encontros naturistas. Creio que os clubes ou associações devem agir de forma clara e decidida, buscando incentivar a presença de toda a família nas práticas naturistas. A simples distribuição de folhetos, por exemplo, com boas dicas e ensinamentos bem concebidos, de acordo com as normas e fundamentos do naturismo internacional, pode ser de grande valia. Evitemos os improvisos.
A nudez, nosso traje de nascença, merece um respeito especial, sempre distante das piadas idiotas, da malicia chula e dos preconceitos sejam eles quais forem. Sexo e nudez não são vergonhosos e nem sinônimo de pecado. É tempo de viver plenamente.
Ao finalizar esse pequeno artigo, conto uma estória bem humorada, mas curiosamente real. Passeando uma certa noite pela Lapa boêmia, para espantar o stress, fiquei sabendo que o Eremildo (o idiota), famoso personagem de Elio Gaspari, é eleitor apaixonado do velho Sarney, fanático defensor das idéias do Papa Bento XVI e, acredite quem quiser, entusiasmado naturista sem lenço ou documento. A verdade é que Eremildo, surpreendido numa sauna gay, logo ele um puritano muito zeloso, não se perturbou de forma alguma, tendo declarado prontamente que apenas estava lá, na sauna, na presença de rapazes nus, para praticar o seu naturismo... O pior é que os Eremildos, infelizes pudicos, multiplicam-se sem parar como anátemas, como pragas de gafanhotos, pois a sociedade vestida sempre estimulou as máscaras, os pretextos, todas as hipocrisias, a pseudociência e os disparates. Até quando?
Aproveitemos a claridade primaveril para retirar os casacos escuros da mentira, da crítica burra em relação aos diferentes, da intolerância ante as diversas orientações sexuais, do falso poder da nudez, da falta de coragem de enfrentar a realidade. Os dogmas (todos), as invencionices ditas religiosas, os tabus ignorantes, o culto do jeitinho oportunista e o cinismo sem escrúpulos na ânsia do poder devem ser rejeitados por quem acredita na beleza e na simplicidade sábia da natureza, inclusive pelos bons naturistas.
É tempo de crescer, de crescer considerando os fatos, a realidade, o que nos comprova a ciência, isto é: tudo o que é demonstrado pelo exame de provas e contraprovas. É chegada a hora de acabar com as falsificações e com as crendices. Charlatanismo e curandeirismo não são medicina... A propósito, relembro um artigo pertinente de Roger Bastide, sociólogo e antropólogo, escrito em julho de 1943 para o jornal “Diário de S. Paulo” e transcrito no livro “O Sagrado Selvagem”. Nele, Bastide lembra a obra do célebre Bérgson, sob o título de “Les Deux Sources de La Morale et de La Religion”, na qual é dito que “o homem é uma máquina de falsificar deuses”... É verdade. O homem, nos recessos de sua mente e para disfarçar os vazios e as dores, vive criando mitos, lendas, forças mágicas e castigos infernais para, repito, fantasiar a realidade nua e crua, as dores do existir e a certeza objetiva da finitude. Bastide conclui o artigo afirmando que a Igreja (leia-se as Igrejas, as religiões) canaliza todas as forças ocultas, todos os delírios, todos os anseios oníricos, servindo-se de todas as máquinas (e pretextos) para criar mitos (e devoções), dirigindo todas as engrenagens e fazendo convergir seus rendimentos e forçando os homens (quase todos) a transformar seus escapes ou deuses míticos no grande Deus...
Concluo, lacônico: nada como a verdade para fazer cair a fantasia... Naturismo não rima com pretexto.
*Paulo Pereira é biólogo, estudioso do naturismo e ex-presidente da Rio-NAT |
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