A NUDEZ
CONTINUA A FAZER HISTÓRIA
por Adauto Felisário
Munhoz*
Há um grande equívoco
entre as pessoas associarem o pecado de Adão e Eva com o sexo e a nudez.
Sem um certo conhecimento de teologia existem aqueles que fazem
comparações do fruto da maçã com os genitais da Eva. Isso revela falta
de conhecimento, pois a Bíblia fala num fruto e não menciona maçã,
porque Deus fez pênis e vagina em ambos para procriarem. Deus diz:
“...mas não comam do fruto da ciência do bem e do mal”. (Cf Gn2,17).
Quando Adão se desculpa dizendo que se escondeu de Deus por estar nu (cf
Gn3,10), não é a nudez do corpo a que a teologia bíblica se refere, mas
porque caíram na tentação do mal. Seduzidos pelo demônio comeram do
fruto com a presunção de se tornarem “deuses”, vendo que isto não
aconteceu chegaram na terrível realidade da desobediência. Foi o
primeiro “Não” do homem ao seu Criador.
Pelo visto a nudez era
encarada de forma natural pelo povo do Antigo Testamento, pois o próprio
profeta Isaías tirou suas vestimentas e durante três anos pregou
inteiramente nu e sem nenhum problema de censura com o povo que o
escutava. (Cf Is 20,2-3) Num outro texto ele incentiva as mulheres a
ficarem nuas como forma de manifestação. ( Cf. Is 32,11 )
Os órgãos genitais não
eram vistos como algo sujo, indecente e vulgar como hoje a sociedade
moderna vê, porque vivemos uma era do genitalismo desvairado onde
predomina o erótico e o pornográfico, pois se fazia o juramento entre
dois homens colocando as mãos sobre os genitais um do outro, incluindo
não só o pênis mas também os testículos. (Cf Gn 24, 2-3-9) e num texto
seguinte (Gn 47,29) mostra que juramentos e promessas também eram feitos
com as mãos sobre os genitais como foi o caso do Jacó com seu filho
José. Também o profeta Miquéias fala em gritar, andar descalço e ficar
nu. (Cf Mi, l,8).
Parece mesmo que ficar nu
era uma forma de se desvestir de tudo até da própria hipocrisia e entrar
em estado de graça. Tudo nos mostra a crer que a nudez era mesmo vista e
considerada como algo sublime, pois o rei Saul a caminho para Naiot foi
agraciado com o espírito de Deus, e então tirando as suas vestes ficando
inteiramente nu, profetizou diante de Samuel. E depois continuando
inteiramente despido como a natureza o fez, ficou prostrado por terra em
êxtase e reflexão durante o dia todo e a noite inteira. E ninguém o
censurou por estar nu, até pelo contrário, houve quem perguntasse se
depois disto Saul não estaria inscrito entre os grandes profetas. (Cf I
Sam 19,24). Ainda hoje essa experiência é edificante pois há quem goste
de rezar e meditar em plena nudez por se encontrar desvestido de tudo
diante de Deus.
Também durante a prisão de
Jesus no Horto das Oliveiras de acordo com a tradição era o próprio
evangelista São Marcos, o jovem que estava vestido apenas com um pano de
linho envolto ao corpo e foge indo embora totalmente nu. É provável que
fosse comum dormir ou andar nu dentro de casa porque e pelo visto a
nudez não era vista da forma suja ou pornográfica conforme apregoa a
doutrina maniqueísta que perdura até os dias de hoje. (Cf Mc 14, 51-52).
Nas tradições daquele
tempo era comum crucificar as pessoas totalmente nuas, mas dentro de uma
conotação religiosa e cristã podemos até interpretar a nudez do Salvador
como um total despojamento, mas a verdade é que na hora em redimia na
cruz a humanidade pecadora Jesus Cristo se encontrava inteiramente nu.
Um episódio famoso é o de São Pedro estar pescando nu quando o Mestre
aparece na praia após a ressurreição. (Cf Jo 21,7).
Outro caso de nudez é o
famoso banho ao ar livre de Betsabeia a belíssima esposa do soldado
Urias. (2 Sm 11, 2). Não resta uma única sombra de dúvida sequer de que
São Francisco de Assis tenha sido o ser humano de maior sensibilidade no
tocante a natureza. Ele a amava, sentia-a, comungava com ela e
extasiava-se com as obras do Criador. Compenetrou-se tanto que conseguiu
comunicar-se com ela, como foi o famoso episódio do lobo de Gúbio, um
animal feroz que ele conseguiu domesticar com suas palavras e o animal o
entendeu. Este mesmo São Francisco pediu a seus frades na hora de sua
morte que o despissem pois queria morrer nu sobre a Mãe Terra nua. No
filme FRANCESCO uma das obras mais bonitas sobre o santo de Assis vemos
ele e seus primeiros companheiros brincarem e tomarem banho nus nos
riachos e cachoeiras, nus e sem malicia ou maldade alguma numa total
integração com a natureza movidos por um grande amor a Deus e ao
próximo. Imoral e sujo é tudo aquilo que excita os devassos e
maliciosos.
O próprio São Tomás Morus
em seu famoso livro “Utopia” fala que nesta cidade ninguém se casa sem
antes, tanto o homem como a mulher, observarem e analisarem o corpo um
do outro inteiramente nu em todos os detalhes, pois que ninguém é
obrigado a casar às escuras, vindo a descobrir imperfeições físicas
depois de casado. (Cf Capitulo “Dos Escravos”).
No decálogo não existe
nenhum mandamento que diz: “Não andarás nu”, ou “Terás vergonha de tua
nudez”.
Santo Agostinho apesar de
ser maniqueísta diz: “Não devemos ter vergonha daquilo que Deus não teve
vergonha de criar”. Já São Paulo Apóstolo diz que para os puros, tudo é
puro.
Nas praias e colônias
naturistas é exatamente onde se vê e se vive o maior respeito entre as
pessoas. Nem é pecado admirar uma pessoa nua, afinal essa é a obra prima
de Deus. O fato das pessoas admirarem o corpo nu uma das outras não
significa exatamente uma perversão sexual, é uma identificação física
dos seres humanos. Anormal seria pensar o contrário, repudiando o outro
ser humano com asco, seria uma repulsa contra si próprio e contra seu
próprio corpo e uma afronta contra o Criador.
O machismo latino não
permite principalmente ao homem admitir essa idéia de achar outro homem
bonito, pois segundo a hipocrisia da sociedade, comprometeria sua
masculinidade o que não deixa de ser um equivoco parvo. No entanto a
Bíblia afirma que não houve em todo o reino de Israel um homem tão belo
e perfeito como Absalão, filho do rei Davi, escultural das plantas dos
pés ao vértice da cabeça. (2 Sm 14, 25-27).
No seu célebre quadro
intitulado “Sagrada Família” também chamado de “Tondo Doni”, pintado
entre 1503 a 1504, Miguel Ângelo nesta belíssima iconografia coloca em
primeiro plano a Virgem Maria com São José e depois o Menino Jesus
inteiramente nu. Já no fundo do quadro em segundo plano estão presentes
cinco jovens nus com os genitais à mostra. Eles são rapazes humanos e
meio anjos representando a pureza. Porque não há nada mais perfeito para
simbolizar a pureza humana do que a própria nudez. Podemos afirmar que
se trata mesmo de um “Ícone naturista”.
O naturismo, desvestido de
toda hipocrisia coloca os seres humanos de forma igual. Louis Charles
Royer em seu livro, “Ilha dos Nudistas” testemunha sua cura de obcecado
sexual através do naturismo. Não se pode ignorar que o mundo está
genitalizado e como dizia um pensador cristão dos anos setenta em um de
seus livros: “Parece que a grande parte das pessoas não possuem mais
cérebro, cerebelo e massa encefálica dentro da cabeça, mas em lugar
destes órgãos estão um pênis e uma vagina nadando no meio do esperma”.
Muitos valores da vida
foram substituídos pela devassidão lasciva, ocultos dentro de uma falsa
moral ética e hipócrita. E isso é confundido com a pureza, a beleza e a
liberdade do naturismo que nada mais é do que, o encontro do ser humano
consigo mesmo, com a Mãe Natureza e com o próximo. Nossos irmãos índios
sabem disso melhor do que ninguém.
Naturismo é a nudez
natural e pura como a de nossos indígenas, chegando a ser pueril. Com
toda certeza quem viveu uma só vez a experiência do naturismo jamais
será a mesma pessoa. O naturismo não é só uma experiência do encontro
consigo mesmo, mas também com o próximo e com a vida em plenitude. Ajuda
a evoluir, respeitar e valorizar o outro como ser humano e filhos do
mesmo Criador.
Todo naturista é
ecologista, não existe naturismo sem ecologia.
A nudez em si é pura,
bonita e salutar. O que torna a nudez feia é o pensamento sujo de certas
pessoas equivocadas que tem problemas de repreensão em relação a moral e
com a sua própria lascividade. Todos nós nascemos nus e no fundo, bem lá
no íntimo de cada ser humano há este anseio de liberdade.
Nossos índios vivem nus há
séculos e entre eles há um clima de respeito e naturalidade. O próprio
Hans Staden, personagem histórico, teve a experiência de viver
totalmente nu por um bom tempo, junto a nudez de nossos indígenas no
litoral paulista. Grotesco, cômica e agressivas são algumas cenas do
filme “BRINCANDO NOS CAMPOS DO SENHOR” (At Play In The Fields of The
Lord), onde a mulher do pastor protestante norte- americano considera
imoral a nudez de nossas índias e tenta vestir nelas calcinhas e sutiãs.
Perverter o que é natural para o antinatural é que é profundamente
imoral e ridículo.