') popwin.document.close() }
Jornal Olho nu - edição N°147 - Fevereiro de 2013 - Ano XIII |
Anuncie aqui |
|||||||||||||
Carta Aberta aos Naturistas por Paulo Pereira*
Ao receber, emocionado, das mãos amigas, e ilustres, de Rayssa e Olavo, representando a FBrN (e a grande família naturista), o chamado “Diploma de Reconhecimento”, por eventuais serviços prestados por mim, ao longo desses sessenta (60) anos, anoto com carinho essa distinção, mas gostaria sinceramente de compartilhar essa homenagem com inúmeros companheiros e companheiras, que tem estado ao meu lado com dedicação e paciência. E até não preciso destacar nomes, sobretudo, porque todos esses amigos moram no meu pensamento e no meu coração, e são pessoas despreocupadas com as formalidades… Efetivamente, ter podido contribuir para a construção de um viver mais natural e mais feliz para muita gente é fato que pode justificar a alegria que sinto. A minha experiência, rica e documentada, por exemplo, na luta pela criação, e direção, da A.N.B. – Associação Naturista Brasileira, com registro na I.N.F., nos anos 1960-70, juntamente com Daniel de Brito e Tácito Antônio Heit, parece-me um marco histórico indelével e digno. Igualmente, minha experiência como Vice-Presidente e Presidente da Rio-Nat (1994/1995) – Associação Naturista do Rio de Janeiro, ao lado
do saudoso Sergio Oliveira, quando tive, inclusive, a oportunidade de conceder uma pequena entrevista histórica ao programa de televisão “Sem Censura”, da TV-Educativa, é outro marco a ser sublinhado agora, mas sem esquecer a publicação de meus vários livros sobre a vida nudista-naturista, desde 1997: “Corpos Nus”, em três edições, “Naturalmente” e “Sem Pedir Julgamentos”, na firme esperança de ter ajudado a entender melhor essa saga extraordinária nudista-naturista. E não devo esquecer, da mesma forma, a minha longa contribuição para o excelente “Jornal Olho Nu”, criação do velho e bom amigo Pedro Ricardo, através dos meus textos para a coluna “Naturalmente”, desde o primeiro número… Faço esses poucos registros com muita humildade porque reconheço que a vida só vale integralmente quando compartilhada.
Quando escrevo essa modesta “Carta Aberta aos Naturistas”, creio pertinente anotar algumas observações, por exemplo, que fiz, especificamente na coluna “Naturalmente”, reproduzidas no meu livro, em 2008… Eu escrevi: “Proponho falar de sonhos (poucos e lúcidos), da verdade, essa quase desconhecida, de mascarados anjos e demônios, e do tempo, essa dimensão enigmática… É bom reafirmar, por exemplo, que a História (com H maiúsculo) do nosso Nudismo-Naturismo, como defendo e como estabelece oficialmente a I.N.F., está fartamente documentada, enriquecida por inúmeros depoimentos idôneos, sobretudo, e ao alcance do estudioso, do pesquisador isento… O momento, rico de aprendizado e de esperanças sempre renovadas, pede e ordena um esforço sincero de reconhecimento e de fraternidade, sem hipocrisias… As verdades, todas, andam um tanto esquecidas, humilhadas, distorcidas, num vasto projeto de lucros fáceis; as ditas meias verdades não são verdades e os sofismas não merecem ser chamados de raciocínios… Fica em mim a impressão, afinal, de que nem tudo está perdido nesse país de contrastes inquietantes, tão nivelado por baixo, especialmente nos últimos anos; mas as verdades naturais e a história real (até a realidade objetiva) ainda tem o seu lugar, sobretudo, porque viver não é um mero exercício de inconsequências”…
Em suma, e para evitar objetivamente alongamentos preciosos, registro o que eu escrevi no meu livro “Naturalmente”, página 44: “Finalmente no domingo, dia 5 (novembro/ 2006), voltei ao Abricó e participei, emocionado, do encerramento (X-Congrenat). Eu estava ali, na minha velha e querida praia de Grumari, confidente de tantos dias gloriosos, e nus, cercado de um punhado de pessoas descontraídas, falando e ouvindo palavras sobre o nudismo de sempre, desde Ungewitter… O amigo Jorge Bandeira, do Amazonas, mencionou os meus queridos irmãos índios, usando um termo da língua nheéngatú para situar os naturistas como “peregrinos nus”. Meus olhos deixaram escorrer muitas lágrimas, certamente gotas das águas dos igarapés recônditos,
que moram no íntimo do meu ser… É verdade. Pode até parecer sentimentalismo ou exagero de quem está chegando aos 70 anos (já cheguei aos 75) de idade, mas ouvir falar do índio, numa praia naturista, no fechamento de um congresso, em meio a homens e mulheres nus, nus como eles, índios, tantos anos depois da minha primeira visita nudista ao Grumari, em 1964, tinha cores e matizes muito especiais para os meus olhos… Chamado a dizer algumas palavras, agradeci a atenção de todos dedicada a mim, velho naturista, e reafirmei que o mais importante é sempre buscar a verdade, sobretudo a verdade natural, as essências vivas da natureza; eu disse, então, que é necessário cultivar a verdade, “somente a verdade”, afirmação que traduzi igualmente na língua nheéngatú: supysáua!”…
A prática nudista-naturista (os dois termos estão consagrados pela I.N.F.) deve priorizar o conhecimento, o coletivo em lugar do meramente pessoal, subjetivo. A prática nudista-naturista define-se pela percepção humanista, secular, múltipla e natural, sem qualquer colocação seletiva ou sectária, ideológica.
A minha referência primeira continua sendo o exemplo do índio no seio nu da natureza, sem lenço e sem documentos… As lições históricas do índio apontam para a nudez plena de dignidade, segundo Darcy Ribeiro, a nudez como dado primeiro, como destaca R. Muraro, sem egocentrismos míopes, sem pudores hipócritas. Eu não exijo que me amem; exijo que me respeitem! Como escrevi no meu livro “Naturalmente, Um Perfil Documentado”, pág. 96, eu conheço bem essas florestas, essas águas de fúria; eu prefiro escutar o cantar dos pássaros silvestres e, sobretudo, o rugido da onça indomável, fazendo-me irmão de Aimberê e de Cunhambebe, valentes e dignos Tupinambás…
Igualmente, eu não poderia deixar de salientar os nomes de três grandes pioneiros ilustres, como a história registra: Luz Del Fuego, Daniel de Brito e Osmar Paranhos. No encarte central do meu livro “Naturalmente”, estão anotados inúmeros documentos irrefutáveis, que demonstram concretamente a existência das várias etapas do chamado Naturismo Brasileiro, desde 1949. O Naturismo Brasileiro, insisto, não nasceu num passe de mágica, mas possui história documentada. Seria importante relembrar, por exemplo, especialmente quando alguns afoitos constroem disparates, que a prática nudista-naturista, segundo a Federação Naturista Internacional, é essencialmente plural, contrária a qualquer preconceito ou distinção, quer seja de idade, cor da pele, fé religiosa, posição social, nacionalidade ou orientação sexual. O naturismo é, antes de mais nada, uma forma de comportamento humanista, uma filosofia de vida que privilegia o universal e o natural. Segundo os postulados oficiais, especialmente desde 1953, não há lugar para preconceitos e subjetividades. A propósito, o velho pioneiro Daniel de Brito, nesse mesmo ano de 1953, nos falou sobre os preconceitos e as mentes livres, numa bela tradução publicada na famosa revista “Saúde e Nudismo”. Daniel escreveu: “Podeis vós vencer um preconceito? Para vencer alguma coisa é preciso reconquistá-la repetidamente… A questão é compreender o processo total do preconceito, e isso não de um modo puramente verbal, mas de modo fundamental, profundo… Como aparece, então, o preconceito? Um dos modos é, sem dúvida, através da chamada educação. A crença é criada, modelada no indivíduo desde a infância, transformando-se num preconceito… Eu vivo na minha fortaleza de preconceitos e vós viveis na vossa; entretanto, olhamos tudo isso por alto e nos esforçamos por sermos amigos. É realmente a forma mais absurda de procurar amizade.
Como pode haver afeição real, se eu vivo no meu preconceito e vós no vosso? Sabemos, então, como surgem os preconceitos, como eles se produzem para nossa autoproteção, que é um processo de isolamento. Somente quando a mente está livre de reações autoprotetoras internas, somente quando há isso, é que existe a possibilidade de liberar-se do preconceito. E, para compreender-nos a nós mesmos deve haver consciência sem coação, sem justificativas ou condenações. É preciso que se tenha consciência livremente, sem qualquer forma de medo.” Esse pequeno texto foi traduzido pelo mestre Daniel a partir do original em língua inglesa chamado “Krishnamurti’s Talks”, de Madras, Índia. Para ser naturista, pois, é preciso, em primeiro lugar, despir a mente, os preconceitos, e não somente tirar as roupas. O naturismo não existe igualmente para suscitar polêmicas vazias nem para promover lucros fáceis.
A minha luta tem sido impulsionada pelo natural, pela natureza suprema e, ao receber o honroso “Diploma de Reconhecimento” da FBrN, busco, sereno, depositá-lo solene e simbolicamente no íntimo de tudo que pulsa e vive, sem medo, sem amarras e sem intolerâncias ou concessões convenientes. Obrigado!
Paulo Pereira Janeiro/ 2013 Escritor, tradutor, biólogo, o naturista mais antigo do Brasil. |
|||||||||||||
Olho nu
- Copyright© 2000 / 2013
Todos os direitos reservados.