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Jornal Olho nu - edição N°171 - Fevereiro de 2015 - Ano XV

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A Queima das Liberdades

 

por Paulo Pereira*

 

No início do novo ano, 2015, o noticiário, vindo de Paris, assustador, sacudia a consciência livre do mundo, dando conta de um massacre covarde, mais um, desta vez na redação do festejado “Charlie Hebdo”... Embora sem constituir grande novidade, e talvez mesmo por isso, era um choque que se alastrava como ondas de um grande terremoto, o das ideias, dos pensamentos, das liberdades.
 

Destaco, então, um pequeno texto do caderno “Prosa e Verso”, de O Globo, da autoria de Isabel Lustosa, sob o título de “As Armas do Humor”, do mês de janeiro último. Como afirmou Isabel, a sátira continua a ser vista como ameaça por tiranos e radicais. Na verdade, acrescento, a agressividade e a estupidez humanas são doenças antigas. Ocorrem, de longa data, atitudes e tentativas de fanatismo, sobretudo o político-religioso, e de intolerâncias descabidas, feitas de obscurantismo. Haveria, por parte de alguns ilustres, a criação de uma nova inquisição, de nova caça às bruxas?...

 

Ocorrem nitidamente desconstruções, muitas vezes veladas, de tudo que seja considerado ameaça por parte de protagonistas tristes da história humana. A agressividade e a crueldade dos homens são fartamente concebidas, pela História, pela Ciência, embora alguns continuem vendo anjos assexuados nos primatas tagarelas...

 

O notável Goethe afirmou com sabedoria que nada é pior do que a ignorância em atividade. Só o conhecimento pode efetivamente mudar algumas situações negativas. Isabel Lustosa, em O Globo, observa que a sátira foi sempre objeto de tensão entre a sociedade e os que produziam. Isabel lembra que no teatro, na literatura ou na imprensa, sob a forma de texto ou de desenho, ela atinge os poderosos... E, por certo, os falsos protagonistas, digo agora, que reagem sempre tentando edificar censuras.

 

Isabel recorda que, ao longo da História, mesmo nos países mais avançados em termos de direitos, alternam-se momentos de censura e de libertação. Relembro, mais uma vez, que Oliver Thomson nos fala com propriedade e precisão sobre a maldade e a crueldade humanas em seu livro “A History of Sin”, colocando a descoberto o lado obscuro (nem tanto) do bicho homem... Poderíamos talvez afirmar que, no fundo, todos os tiranos e radicais são esfinges de areia, que os ventos do tempo derrubam, mas ficam sofrimentos, perdas, mortes, dores, sempre. A dor parece-me a grande história da vida, afinal.
 

O ano de 2015 começa agitado, super quente nos trópicos, a cultura e as liberdades agredidas, ameaçadas. Então, é tempo de resistir, de unir as consciências livres, na luta por um existir mais tranquilo. E, aí, os companheiros nudistas-naturistas conhecem bem a grande luta contra os repetidos preconceitos, contra os pudores hipócritas e os moralismos de ocasião. É sempre tempo de recordar autores consagrados, como William Welby, que nos ensina a simplicidade e a naturalidade que devem nortear a boa prática nudista-naturista. Como nos recorda Welby, o viés psicológico, por exemplo, do nudismo merece mais atenção e crédito. Welby escreve que levou algum tempo para que o Nudismo (Naturismo) fosse aceito como racional, apropriado, entre a população em geral. Ele registra: “There is more is Nudism than just exposure of the skin to the sun”... Pensemos, então nisso com seriedade.
 

Se, de um lado, jornalistas e escritores são mortos ou perseguidos, de outro lado cresce a conscientização das liberdades individuais, e a força da natureza é afirmada, sempre. Como contraponto às intolerâncias, anoto o artigo publicado na Revista de Domingo, O Globo, em 11/01/2015, matéria de capa, sob o título de “Despidos de Fantasia”, a nudez pela lente do carnaval, de autoria de Carolina Ribeiro. O fotógrafo Ramon Moreira registra a folia de rua, e os foliões usam apenas alguns acessórios, mostrando toda sua nudez festejada! Há, como está dito no texto, a desconstrução da fantasia, e o prestígio do corpo natural, sem máscaras, sem retoques.

 

Eu, Paulo, que faço parte desse “bloco sem fantasia”, nudista, há mais de sessenta anos bem vividos, sinto-me aliviado, na esperança de ver a nudez aceita como dado primeiro, no dizer de Muraro, a nudez digna do índio, a nudez sem pudores angélicos. Afinal, nos quatro cantos do planeta, todas as crianças continuam nascendo totalmente nuas, indiferentes aos radicais, aos pudicos hipócritas, aos ignorantes pernósticos.

 

Os solenes minutos de silêncio, em homenagem aos mortos das violências, pedem uma reflexão mais profunda, fazendo-se a distinção clara entre verdade e fantasia, e valorizando o grande silencia da sabedoria. Precisamos, como tenho proposto, do silêncio nobre, do pensamento sem amarras. Existe uma alegria preciosa a ser descoberta a cada dia, vivida com serenidade, sobretudo, na prática da grande simplicidade voluntária. Como nos disse o Lama Surya Das, a paz da mente é o maior de todos os tesouros secretos.

 

Em tempo: É importante recordar, de passagem, que a queima de livros e de arquivos, considerados incômodos por tiranos, já aconteceu inúmeras vezes, como, por exemplo, no regime nazista da Alemanha, e nas ditaduras sul-americanas do Chile e da Argentina. A liberdade incomoda os fanáticos.

 

*membro do Conselho Consultivo da FBrN

pereiranat37@gmail.com

 

(enviado em 3/02/15)


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