A partir deste ponto republicação das matérias apresentadas
originalmente na seção "Últimas Notícias" do jornal OLHO NU,
entre 1 e 28 de fevereiro de 2015 |
Dia do
Nascimento de Luz del Fuego
Dia
Nacional do Naturismo
por Evandro Telles e
Jorge Bandeira
21 de fevereiro, Dia
Nacional do Naturismo, data do nascimento de Luz Del Fuego (Dora
Vivacqua – 21/02/1917), precursora do Naturismo brasileiro. Em 2017
faria 100 anos se viva estivesse. Com muita propriedade, Paulo Pereira
em seu livro “Corpos Nus” escreveu: “Dora está fora da jurisdição desse
mundo”.
Uma
mulher à frente do seu tempo, corajosa, amiga dos animais e culta. Quem
quiser conhecer um pouco mais da sua história poderá ler também os
livros “A Bailarina do Povo” de Cristina Agostinho e “A Verdadeira Luz
Del Fuego” de Thiago de Menezes. Aproveite também para ler o belíssimo
cordel “A Vida de Luz Del Fuego” de uma inspiração do amigo Jorge
Bandeira que não tenho palavras para descrever, incluo no final desse
texto.
Dos anos 50 até os dias
atuais o Naturismo teve avanços significativos, não em termos
quantitativos, mas muitos trabalhos foram desenvolvidos em faculdades,
livros, cursos pela internet, participação em encontros literários,
informativos virtuais, entrevistas em jornais impressos e a recente
rádio naturista. Nenhuma pessoa letrada pode afirmar que desconhece a
filosofia naturista, mas segundo o último censo demográfico somos
aproximadamente 194 milhões de habitantes e aqui temos também um número
significativo que não faz a mínima ideia do que representa o movimento
naturista no mundo.
No artigo que enviei para
XIV Congrenat disse que “Ser Naturista” é aquele que busca o
conhecimento e entenda a evolução da sua própria natureza. Quis dizer
com isso que existe a necessidade do conhecimento científico, mesmo que
a nossa miopia seja perene, o comodismo não ajudará em nada às futuras
gerações. Por esse motivo tenho incentivado os jovens a conhecerem o
Naturismo e entenderem o que diz o amigo João Olavo: “Naturismo pode ser
a transformação que o mundo necessita, pois privilegia o cuidado com o
meio ambiente, o combate ao capitalismo, o egocentrismo, exibicionismo e
o consumismo exagerado, sendo o Naturismo o antídoto dos males do mundo
porque nos ensina a viver de maneira simples em harmonia com a
natureza." Sábias palavras!
Todos nascem livres,
poucos morrem do mesmo modo.
A disparidade entre o
número da população dos praticantes do Naturismo é um indicador forte do
quanto as pessoas ainda estão presas aos seus conceitos sociais, o
quanto ainda o corpo é tratado como algo que deve ficar escondido e, na
realidade, esconde um lado psicológico assim diz Dr John Veltheim em seu
artigo “Nus por baixo da roupa”: Nos últimos séculos, as pessoas
desenvolveram uma dependência cultural da roupa. As vestes tornaram-se
uma máscara e um adereço de suporte para tapar falhas, muitas vezes
percebidas, de personalidade e de caráter.
Devemos comemorar o Dia do
Naturismo como uma conquista de liberdade, não somente de uma liberdade
corporal, mas principalmente mental. Uma luz que se conquista das
barreiras impostas por uma cultura que marginalizou o corpo. Como nos
diz Joseph Pearce no seu livro “O Fim da Religião e o Renascimento da
Espiritualidade”: O Conformismo cultural ameaça a individualidade, a
mente capaz de pensar para além das coerções tanto de nossa herança
animal quando da cultura e seus efeitos globais. Só uma mente individual
pode retomar o impulso evolutivo da vida e criar independentemente dos
revestimentos e restrições artificiais que a cultura impõe. Nós, seres
humanos, fomos feitos para essa individualidade perdida e ansiamos por
ela.
A VIDA DE LUZ DEL FUEGO
PIONEIRA DO NUDISMO NO BRASIL
J. Bandeira
TRANSLÚCIDA LUZ
O Louco:
“Dia virá em que não haverá tecelões e ninguém para usar roupas. Todos
nós ficaremos nus sob o Sol”.
(primeira fala deste personagem no início do texto “Lázaro e sua amada”,
de Kahlil Gibran, em sua única obra escrita para o Teatro).
“Nu saí do ventre de minha mãe, e nu tornarei para lá” (Livro de Jó
1-21)
“Nu eu nasci, e nu me encontro: não perco nem ganho” (Miguel de
Cervantes)
ESTE CORDEL É DEDICADO A JOÃO CARLOS e EDVAL FONSECA.
1
Amigos de todo Brasil
O relato que vou contar
Dá conta de certa mulher
Corajosa no seu lutar
Batalhou por uma nobre causa
Sua bravura foi exemplar
2
Ela era idealista
Disso eu tenho a certeza
Percalço encontrou na vida
E nela não teve moleza
Lutou pelo nudismo
Entrou na causa com firmeza
3
Nasceu como Dora Vivacqua
Há muito tempo atrás
Em 21 de Fevereiro de 1917
Não esqueço a data jamais
Quando nasceu Luz Del Fuego
Para o nudismo e seus ideais
4
Era uma capixaba
Natural do Espírito Santo
Da cidade do Rei Roberto Carlos
Dois artistas do mesmo canto
Dora iria ser Luz Del Fuego
E como Roberto causaria espanto
5
Cachoeiro do Itapemirim
Era sua cidade natal
Amava sua irmã Mariquinhas
Que para ela não tinha igual
Mariquinhas era musa de Drummond
O nosso poeta genial
6
No começo dos anos 20
A família Vivacqua se muda
Escolhe Belo Horizonte
Para continuar sua luta
A nossa futura Luz
Começa a ficar desnuda
7
Foi necessária uma ajuda, que
Um serpentário lhe inspirasse
Para que Dora Vivacqua
Das serpentes se aproximasse
E seus posteriores números
E musicais, a todos arrebatassem
8
Conheceu nossa menina
O Instituto Ezequiel Dias
Seu passeio predileto
Muitas vezes foi com as tias
Vislumbrar aquelas serpentes
E nos seus olhinhos brotavam alegrias
9
A bolsa de Nova York quebrou
Era 1929, ano do famoso Crack
O capitalismo pedia socorro
Quem for pobre que se esmague
Os Vivacqua voltam pra Cachoeiro
Cidade que só possuía um parque
10
Etelvina, mãe de Luz
Ficou perto de Antônio, seu marido
O pai de nossa futura Luz
Era um homem embrutecido
E jamais permitiu às filhas
Que ficassem nuas, sem vestidos
11
Dora Luz entra na adolescência
Demonstrando um gênio forte
Não agüentava desaforos
E também tinha muita sorte
Ordens e opiniões só aceitava
Se na sua vida não fizessem cortes
12
Mesmo jovem já andava nua
E escandalizava toda meninada
No quintal da casa brincava
Como Deus a fez, pelada
Não gostava de usar roupas
Que ficavam dias sem serem lavadas
13
Em agosto de 32, seu pai Antônio
É assassinado por inquilinos de seus terrenos
A pacata Cachoeiro estava perigosa
A morte não os deixou serenos
Etelvina volta para Belo Horizonte
Buscando para família ares amenos
14
Dora Vivacqua, futura estrela
Sente-se sufocada com tantos atritos
Sua vida seria na cidade maravilhosa
Onde ela poderia soltar seus gritos
E pela liberdade da nudez
Planejar inclusive seus escritos
15
Sua meta era o Rio de Janeiro
Que ela não tirava da visão
Apesar de seus poucos 15anos
Pensava no Rio em chegar de avião
Só sossegava quando a cabeça
Sonhava com a Guanabara, sua paixão
16
Dora odiava usar sutiã
Ela gostava era de estar nua
Pela praia de Marataízes
Improvisava as roupas suas
E isso quando o biquíni
Não existia, não se via nas ruas
17
Chega na Capital Federal
Sob a tutela de seu irmão Attilio
No Rio Dora se transforma
Adorava jogar seus brilhos
A gênese do nudismo no Brasil
Começa a assentar seus trilhos
18
Com 19 anos vive um romance
Com tal José Mariano
De família importante no Rio
Coisa que não agradou seu mano
Foi por isso que Attilio, seu irmão
A mandou de volta para Minas, sem engano
19
Em Minas uma desgraça acontece
Sua irmã Angélica, atônita
Flagra seu marido Carlos com Dora
Numa visão que lhe deixa afônica
Ele bolinava Dora, a seduzia
Numa cena forte, crônica
20
A família fica a favor de Carlos
E considera Dora mentirosa
No Hospital Psiquiátrico Raul Soares
A confinam de maneira dolorosa
É tida como esquizofrênica
E por dois meses sua vida ali será pavorosa
21
Preocupado com a irmã Dora
Depois que ela saiu do internamento
Seu irmão Achilles lhe faz um convite:
Vá para fazenda de Archilau ter novo alento
Lá você vai respirar um ar puro
Vai descobrir novos encantamentos
22
E na fazenda de seu outro irmão
Dora aparece como Eva
Coberta somente com 3 folhas de parreira
Caminhando naturalmente na selva
O filho do administrador a viu nua
E nem precisou se esconder atrás da relva
23
Aquilo Archilau não aceitou
E por ele Dora foi repreendida
Ela não contou duas vezes
Jogou-lhe um vaso na cabeça partida
Aquele ato trouxe-lhe conseqüências
E lá vai Dora pra outro hospício, ressentida
24
Agora nossa Dora Vivacqua
Que será conhecida como Luz Del Fuego
É internada no famoso hospício
Casa de Saúde Dr. Eiras, no desassossego
Seu espírito rebelde produzia vôos
Imprevisíveis como os do morcego
25
Dessa vez é sua irmã querida
Por quem tem uma profunda admiração
Que resgata Dora do hospício
Levando-lhe para outra estação
Em sua cidade de Cachoeiro
Mas Dora foge desesperada e chega ao Rio num lotação
26
Dora no Rio de Janeiro
Reata sua relação com Mariano
Sem oficializar sua união
Era livre e não queria nenhum dano
Para sua vida pelo casamento
Não queria entrar pelo cano
27
Tentou ser pára-quedista
Porém Mariano a impediu
Aceitou e viu no pedido dele
Uma demonstração de amor juvenil
Como aquele de ideais
De paixões, de uma vida pueril
28
O amor furacão de Mariano
Só agüentou algumas estações
Até que Dora resolve entrar na dança
Que todos sabem era uma de suas paixões
O ciúme doentio de Mariano
Começará a lhe trazer aporrinhações
29
Mas ela não desistiu da dança
E na Academia Eros Volúsia
Continuou seu curso brilhante
Dançando com muita astúcia
Não deu a mínima ao ciúme de Mariano
Era uma leoa por dentro de um ser de pelúcia
30
E assim acontecia
Na vida desta de nome Dora
Porém Luz Del Fuego irá chegar
E é pra já e agora
Uma nova fase em sua vida
De Dora o nome ela joga fora
31
Era o ano de 1944
Faltando mais um para a Guerra acabar
Que um nome começa a aparecer
Luz Divina espera triunfar
E no circo Pavilhão Azul
O público irá lhe aclamar
32
Atenção, senhoras e senhores
Vejam só que mulher exótica
Carrega suas incríveis serpentes
Vejam, isso não é ilusão de ótica
É a corajosa bailarina Luz Divina
Com cobras verdadeiras e não robóticas
33
Era a maior atração do circo
Nas noites de espetáculos
Luz garantia um bom público
A casa lotava sem obstáculos
Para ver Luz e suas jibóias
Que fazia inveja aos homens másculos
34
Era toda encantamento
A sua dança provocante
Na companhia de duas cobras
Seu número ficava mais excitante
Cornélio e Castorina, ora vejam
Eram os nomes dados àquelas rastejantes
35
Quando termina a 2A Guerra Mundial
Dora anotava tudo em seu diário
Suas experiências pessoais, viscerais
Dariam boas matérias para um noticiário
Era o começo do que viria a ser
Um livro que não tirou de seu imaginário
36
Sim, podem ter certeza
Nossa artista era sedutora
Seu livro “Trágico Blecaute”
Foi lançado por uma editora
Mulher de muitas virtudes
Nossa nudista maior era escritora
37
Em 1947, por sugestão de um amigo
Que era palhaço e se chamava Cascudo
Luz Divina virou Luz Del Fuego
“Nome estrangeiro atraía público graúdo”,
Tanto insistiu Cascudo com Luz
Que seu nome artístico teve um novo atributo
38
Luz Del Fuego era o nome
De um batom argentino novo
Que apareceu no Brasil nessa época
De brilho forte e vistoso
Era chamativo como nossa estrela
Que foi artista num período majestoso
39
O fogo era representativo
Pois sua vida era uma labareda
Sua nova opção de vida
A fez conhecida nas alamedas
A Vivacqua “água viva”
Deu lugar ao Fuego e sua destreza
40
Trabalhando em vários circos
Luz os ajudou com as “casas cheias”
Livrando da falência muitos deles
Fez muita gente ganhar o seu “pé de meia”
E assim ia levando a vida
De artista nos palcos tecendo teias
41
E como boa fiandeira
Conseguiu um bom contrato
No Teatro Follies
Onde representou mais de um ato
Naquela Copacabana ensolarada
Luz viu nascer seu estrelato
42
Um garoto de 12 anos
Era responsável pelas falas e apontamentos
Que Luz jamais decorava por inteiro
Ela improvisava sem ressentimento
O nome deste menino? Daniel Filho, ele mesmo
Que na Rede Globo foi um grande talento
43
A imprensa alardeou
O espetáculo “Mulher de todo mundo”
Luz Del Fuego era sensação
Sua família sentia no fundo
Que toda essa fama de artista
Para seus inimigos poderia virar um trunfo
44
Seu irmão Attilio era senador
E esse “ba-fa-fa” não era bom
Ter uma irmã que dançava nua
Em seus ataques esse seria o tom
Esses políticos nunca entenderiam
O que é uma artista ter um dom
45
Iluminar e dar alegria ao povo
Seria a missão dessa bailarina
Que em seus números ficava seminua
O braço do povo seria sua sina
E com isso seu irmão senador
De bondoso passou a ranzinza
46
Attilio não perdeu tempo
Para abafar qualquer reboliço
E do livro de Luz “Trágico Blecaute”
Da edição primeira deu um sumiço
Queimando mais de mil exemplares
Parecendo um inquisidor suíço
47
O diário escrito por Luz
Trazia fatos comprometedores
Como a sedução do cunhado
Que de Luz foi uma das dores
Sem contar uma assumida prostituição
Que pelo livro criava dissabores
48
Contando esta história
Vocês irão me dar razão
Uma pessoa só vence na vida
Com amor e dedicação
Mesmo que seja pelo nudismo
Que no Brasil sofre discriminação
49
Os anos 50 estão chegando
E nossa artista se consolidando
A naturalista e vegetariana
A passos largos vai andando
Criando fama e admiração
Também seus inimigos vão tramando
50
Contra ela falam de tudo
De depravada a pessoa devassa
E nisso essa mulher de fibra
Esperneava e achava graça
Suas idéias eram originais
Sua arte a todos abraça
51
Com o lançamento de seu livro
O já falado “Trágico Blecaute”
Suas intervenções serão lidas
Começarão novos embates
Os defensores da falsa moral, puritanos
De Luz farão o alvo de seus disparates
52
Para nossa defensora
O nudista é aquela pessoa
Que acredita que as roupas
Com toda pompa de quem a veste ressoa
Não significa moralidade
E desta falsa visão ela caçoa
53
Não acha que o corpo humano
Que é considerado por muitos profano
Tenha partes indecentes
Que se precisam esconder com pano
E disso estava tão convicta
Que não demonstrava desengano
54
No Brasil daquela época
Onde até o maiô era imoral
Imaginem vocês, leitores
O que Luz deve ter feito para ganhar moral
E fazer com que o nudismo
Entrasse na discussão nacional
55
Começou então Luz Del Fuego
A reunir um grupo de amigos
Na praia de Joatinga, deserta
Onde praticava naturismo aos domingos
Levava alguns cães para proteção
E seus amigos Lana, Gilda e Domingos
56
Miss Lana e Miss Gilda
Eram transformistas assumidos
Domingos Risseto era artista
De Luz eram muito queridos
Estes pioneiros do nudismo
Eram naturistas aguerridos
57
Para garantia contra os abelhudos
Que perturbam sempre os pelados
Levava também suas serpentes
Cornélio e Castorina sempre ao seu lado
Para evitar um maior atrevimento
Dos que acham o corpo humano um pecado
58
Apesar de todo cuidado
A polícia sem engano
Vez por outra levava
A todos nus num ato insano
Para delegacia de bons costumes
Sem terem feito nada de leviano
59
Seu segundo livro é lançado
Chama-se “A Verdade Nua”
O título já dizia tudo
O nudismo é uma bandeira sua
Ele lhe dá evidência
Seu nome de novo ganha as ruas
60
É um livro autobiográfico
Feito com toda dedicação
As bases da filosofia naturista
Estavam entrando em ação
Até o integralista Plínio Salgado
Ao posfácio deu sua contribuição
61
Foi outra obra perseguida
Sofrendo com a censura
As autoridades a bloquearam
Levantando suas injúrias
Ninguém achava o livro
Só no reembolso sua compra era segura
62
Já conhecida no Brasil inteiro
Luz levava todos ao delírio
Era o tempo das vedetes
Mulheres que aos olhos eram colírio
Mara Rúbia, Virginia Lane e Dercy Gonçalves
Todas figuras de intenso brilho
63
No mundo das vedetes
Luz Del Fuego brilhava
Foi na época de Elvira Pagã
Sua maior rival, que admirava
Época de grandes espetáculos
Nos anos 50 ninguém as vaiava
64
Foi capa de revista famosa
A LIFE dos Estados Unidos
Todos queriam sua presença
Seu cachê era garantido
Caprichava nas apresentações
Onde seu corpo era exibido
65
Sua vida era agitada
E disso tirava proveito
Nunca se amedrontava
Peitou delegado, juiz e até prefeito
Tudo lutando pela causa
Do nudismo que para ela era perfeito
66
Seus irmãos se davam bem
Na política, comércio e no social
E achavam que Luz Del Fuego
Manchava seus nomes como um vendaval
Que passava destruindo tudo
Até mesmo o baluarte da falsa moral
67
Attilio como senador
Era o que mais se sentia difamado
Por ser irmão da famosa artista nua
Os adversários o haviam caçoado
Perdeu uma eleição por isso
A oposição o havia molestado
68
Diziam que sua irmã
Era uma mulher do demônio
Que dançava nua nas ruas
Acabando com o matrimônio
Attilio ficou furioso
E perseguiu Luz e seu patrimônio
69
Com tanta perseguição
Luz resolveu revidar
Antes de ser surrupiada
Nua ameaçou dançar
Nas escadarias do senado
Fazendo Attilio se calar
70
Em matéria de dinheiro
Falava ironicamente de seu jeito
Que seu banco preferido
Tinha o nome de preconceito
E era mantido por seus irmãos
Que mazelas a tinham feito
71
Enquanto isso acontecia
Luz continuava na vida animada
Cercava-se de amigos gays
Seus shows eram festas lotadas
Sempre com seu parceiro de palco
Domingos Risseto, camarada
72
O grande feito político
Na vida desta figura
Foi criar um partido nudista
Que seria banido pela censura
O Partido Naturalista Brasileiro
Que no nudismo tinha lisura
73
Angariava fundo ao PNB
Dançando nas escadarias
Do grande Teatro Municipal
Seminua ouvindo baixarias
Dos falsos puritanos de plantão
O que só aumentava suas estripulias
74
O PNB não durou muito
Nem mesmo foi registrado
Graças à ação de Attilio
Seu irmão desalmado
Que tudo fez para o Partido
Seu registro ter sido negado
75
O legado do naturismo
Filosofia e ética de vida
Onde todos estão nus
A nudez é coletiva
Faz com que Luz
Tivesse uma nova iniciativa
76
E Luz não estava parada
Mesmo com o fim do partido
Seduziu o Ministro da Marinha
Um velho seu conhecido
Os passos estavam dados
Para sua ilha de nudismo ter surgido
77
Ganhou assim a cessão
Da Ilha Tapuama de Dentro
O porto seguro do nudismo
Que para os pelados era um alento
Ali o nudismo brasileiro
Existia com bons ventos
78
Logo a Ilha foi batizada
Como Ilha do Sol, um paraíso
Nome dado por Luz Del Fuego
Que do nudismo fez um atrativo
Todos por ali sabiam
Ficar nu na Ilha não era ato apelativo
79
A Ilha do Sol ficou famosa
Virou atração na Cidade Maravilhosa
Mesmo não fazendo parte
Do turismo, era não oficiosa
Por ali passaram as estrelas
Com suas famas luxuosas
80
Lendas do cinema americano
Passaram pela famosa ilha
E só entravam nela nus
Mesmo que fossem em família
Dos velhos às crianças
Andavam pelados em suas trilhas
81
No final dos anos 50
A ilha teve seu apogeu
Recebendo inúmeros sócios
De famosos artistas àqueles que ninguém conheceu
Suas festas, reuniões e filmagens
A prática do nudismo fortaleceu
82
De Errol Flynn
A Lana Turner, astros
A todos acolhia
Suas roupas não deixavam rastros
Ficavam nus com alegria
E ainda faziam bons gastos
83
Ava Gardner belíssima
Tyrone Powell magistral
Conheceram a Ilha do Sol
E para lá levaram alto astral
Viveram nus bons momentos
Acharam o local monumental
84
César Romero aportou
Glenn Ford caminhou
Andaram nus na Ilha do Sol
A imprensa até noticiou
Luz estava feliz
Seu sonho se realizou
85
Até Brigitte Bardot
Na época uma musa do cinema
Esteve nua na ilha
O que pra ela não foi problema
Era uma nudista conhecida
Ficar nua não era um dilema
86
O fato mais pitoresco
Aconteceu com Steve MacQueen, o ator
Que levou um baita susto
Ficando de toda cor
Acordando com a Jibóia de Luz
Em cima de seu peito com pavor
87
Já com a loira atriz
Jayne Mansfield exibida
Aconteceu uma rejeição
Pois ela não quis ficar despida
E Luz não abriu exceção
Deu-lhe um adeus de despedida
88
Os anos 60 chegavam
E Luz estava envelhecendo
Seus amantes ricos influentes
Aos poucos foram desaparecendo
Só lhe restando a Ilha do Sol
E poucos nudistas por lá aparecendo
89
Começou então o envolvimento
De Luz com Júlio pescador
Que era forte e analfabeto
Ficando ao seu dispor
Os dias de glória de Luz
Perdiam o seu esplendor
90
O último amor de Luz
Foi um guarda portuário
Chamado Hélio Luís da Costa
Homem de hábitos vários
Deixando os poucos amigos de Luz
Preocupados e muito temerários
91
Os amigos receosos
De algo acontecer
Com Luz, sozinha na ilha
Sem ninguém a lhe socorrer
Se acontecesse algo grave
O que não demorou a se suceder
92
Que os amigos nada temessem
Luz falava categoricamente
“Sou uma Luz que não se apaga”
Dizia de forma convincente
E assim foi levando a vida
Não dava trela ao perigo eminente
93
Era o ano de 1967
O trágico fim se aproximava
Pois sua morte foi tramada
Luz seria assassinada
Em 19 de julho deste fatídico ano
E a polícia não pôde fazer nada
94
A vingança foi a causa
De sua cruel morte
Junto com seu caseiro Edgar
Luz não teve nenhuma sorte
Dois irmãos assassinos
Nos corpos deixaram profundos cortes
95
Os nomes de seus algozes
Resolvi deste cordel omitir
Pois não quero que os mesmos
Fiquem impressos ao porvir
Suas ações fizeram um luto
Que o nudismo custou suprimir
96
Depois de ter sido “convertido”
Um dos assassinos escreveu
Um relato descarado
De tudo que na Ilha aconteceu
Naquele trágico episódio
Onde Luz Del Fuego faleceu
97
Seu legado inconteste
No nudismo foi fortalecido
E depois da ditadura
Seus trajetos foram reconhecidos
Da praia do Pinho a Tambaba
Novas áreas de nudismo têm surgido
98
No Rio temos Abricó
Em Floripa a Galheta
Todas áreas de naturismo
Onde estar nu não dá “treta”
A vida de Luz Del Fuego
Serve de exemplo e grandeza
99
Passando por Massarandupío
Barra Seca e outros locais
E ainda recantos e clubes
Onde o naturismo possui um cais
Um lugar para aportar
Projetar seus ideais
100
O nudismo tem sido acolhido
Até na floresta amazônica
Lá existe o GRAÚNA
Grupo que faz do naturismo sua tônica
Que busca nas origens indígenas
Uma nudez social orgânica
101
De algo temos certeza
Em relação ao naturismo organizado
Sua força está crescendo
A Lei Gabeira está ao seu lado
Garantindo a todo naturista
O direito de não ser importunado
102
Termino aqui este relato
Da trajetória desta artista formosa
Que do nudismo foi pioneira
E teve vida gloriosa
A todos os meus leitores
Deixo um abraço e uma Luz vistosa.
FIM
Manaus, Março e Abril de 2005.
Bibliografia de referência
AGOSTINHO, Cristina. Luz
Del Fuego: a bailarina do povo. RJ, Best Seller, 1992.
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AMAZÔNICO:
No Orkut procure a
comunidade: NATURISMO EM MANAUS.
Graúna-Am (Grupo Amazônico
União Naturista)
O PIONEIRO DO NORTE
NATURISTA NA NET!
Observação: este cordel
foi publicado pela Editora Acauã no ano de 2005, sendo lançado com o
patrocínio da SONATA, no Estado da Paraíba.
Atualizado em 16 de
janeiro de 2011.
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