Por Pedro Ribeiro
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"Aventuras de Hans Staden" foi um livro inspirador para o Naturismo do jovem Paulo Pereira (capa do livro original) |
No dia 6 de outubro, Paulo Pereira completa 83 anos. Dos vinte anos de existência do jornal OLHO NU, Paulo Pereira participou de vinte. Desde a primeira edição em agosto de 2000, ele está presente com suas crônicas, sabedoria e testemunhos históricos. Muito jovem iniciou-se no Naturismo, por influência da fortíssima atração que sentia (e sente) pelo modo de vida dos índios brasileiros, como bem revelou-se na matéria da edição anterior. Tinha como livro de cabeceira, na infância, "As aventuras de Hans Staden", versão contada por Monteiro Lobato da história do aventureiro alemão que foi capturado pelos índios Tupinambás no século XVI. Não chegado a arroubos de exibicionismos pessoais e com muita modéstia, não foi fácil tirar estas informações dele.
Contemporâneo de Luz del Fuego, que o fascinava, teve o prazer de conhecê-la pessoalmente por causa de um de seus muitos ofícios, o de jornalista, entrevistando-a para uma matéria de uma revista alemã sobre Naturismo. O biótipo de Paulo e o fato da revista ser alemã levaram Luz a dar-lhe a alcunha carinhosa de "alemãozinho", como era tratado por ela toda vez que se encontraram após a matéria e terem se tornado amigos, amizade interrompida com a trágica morte de Luz, em 1967.
Paulo abraçou a causa naturista desde a adolescência, oriunda de seus profundos sentimentos íntimos, que o empurravam para a prática da nudez, pelo contato com a natureza exercido inicialmente no casarão onde residia no bairro da Tijuca, na cidade do Rio de Janeiro. Mas este local não lhe bastava e foi procurar lugares mais amplos e selvagens, como eram a Prainha e Grumari na década de 1960, do século passado. Logo encontrou parcerias que frequentavam os mesmos locais, e o sentido de organização foi surgindo espontaneamente. Juntamente com outros precursores se juntou a F.N.I.B.”- Fraternidade Naturista Internacional do Brasil, grupo criado pelo professor Daniel de Brito, que se manteve coeso e atuante mesmo durante os anos iniciais da Ditadura militar, que considerou subversivo qualquer movimento social que fugisse dos padrões tradicionais estabelecidos, tanto no campo da política quanto no dos costumes. Com a censura prévia aos meios de comunicação, a divulgação de forma ampla dos grupos naturistas brasileiros foi reduzida quase a zero e muitos se extinguiram.
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Paulo publicava artigos para revistas internacionais sobre Naturismo. No exemplo acima escreveu para revista inglesa Sun and Health, um artigo sobre a Prainha, no Rio de Janeiro, traduzida para o inglês como Pearl beach. |
Ainda no auge de sua juventude no início da década de 70, formou-se em biologia, que agora o aproximava ainda mais da natureza e deixando-o apaixonado pela matéria, reafirmando sua vocação para o contato físico com o natural. O Naturismo ainda era uma de suas paixões, mas já não podia partir para a prática ostensivamente. Por iniciativa de Paulo, em 1969 a Fraternidade transformou-se na ANB (Associação naturista Brasileira), mas os encontros de seus membros passaram a ser discretas, quase secretas. E as idas às praias de Prainha, Grumari e Reserva passaram a ser clandestinas, por causa da repressão oficial. Ainda assim, o Brasil se fez representar oficialmente no Congresso internacional de Naturismo realizado em Koversada, antiga Iugoslávia, em 1972 pela recém formada ANB.
Estudioso, começou a se interessar pela história do Naturismo no mundo, pesquisando e fazendo dezenas de artigos que raramente eram divulgados. A prática naturista durante os anos do regime militar sempre foi discreta, cuidadosa, mas efetiva, concreta no final da década de 70 e início de 80, quando nos meados dessa última, surgiu o advento da Praia do Pinho, após o final da Ditadura Militar, no período chamado de Abertura, quando as publicações deixaram de ter censura prévia e o Naturismo pode ser novamente livremente divulgado. Paulo Pereira se engajou novamente no movimento que ressurgia com força vindo do Sul do Brasil. Tornou-se membro da Rio-NAT (Associação naturista do Rio de Janeiro) e logo tornou-se um dos líderes, culminando por exercer a presidência da entidade.
Com o Naturismo se ampliando vertiginosamente, com vários grupos sendo criados em diversas partes do Brasil, Paulo se dedicou ainda mais à sua vocação estudiosa e jornalística, começou a escrever e lançar livros sobre o assunto. Novas lideranças surgiram no Brasil inteiro. O naturismo estava na mídia intensamente. Haviam debates, enquetes, reportagens nas emissoras de rádio, televisão e jornais por todo o país. Paulo participou ativamente deste período. Foi entrevistado no conceituado programa Sem Censura, da TV Educativa, em dezembro de 1994, para falar da proibição pela justiça da prática do Naturismo na praia do Abricó, no Rio de Janeiro.
No ano de 2000, quando o jornal OLHO NU foi lançado, Paulo foi o primeiro articulista fixo da mídia. Criou a seção "Naturalmente" onde apresentou crônicas, críticas e matérias históricas do Naturismo, sempre com foco bem ajustado e de grande qualidade literária e acadêmica. É por isso que nestes vinte anos de comemoração do jornal OLHO NU, Paulo pereira não poderia deixar de figurar como destaque e me permitir esta pequena homenagem, muito aquém da que merece por tudo que já fez pelo Naturismo brasileiro. Desta forma estão disponibilizadas por esta seção algumas das matérias de sua autoria ou relacionadas a ele, selecionadas com muita dificuldade, por causa da grande qualidade de todas elas. Porém todas as matérias publicadas, além das apresentadas a seguir, estão disponíveis bastando acessar cada uma das edições anteriores do jornal através do nosso sistema de Busca Interna.
Paulo Pereira estreou no jornal OLHO NU logo na primeira edição com matéria de destaque, já com seu estilo franco, reafirmando com todas as letras que não existe diferença histórica que justifique a diferenciação de uso entre nudismo e naturismo, questão que continua polêmica vinte anos depois.
A primeira entrevista concedida por Paulo ao jornal OLHO NU foi em 2006 na residência do saudoso Sérgio de Oliveira, fundador da RIO-NAT. Paulo conta muito de sua vida à frente do Naturismo e da história do Naturismo brasileiro, que nunca é demais repetir.
Paulo Pereira e a história do pioneirismo
Os "Comandos Naturistas" foram tema histórico de sua coluna em duas partes. A primeira, foi publicada na edição 186, em maio de 2016, a segunda na edição 188, em julho do mesmo ano. Evento pouco conhecido da história do Naturismo brasileiro foi de grande importância para manter acesa a filosofia e o movimento naturista no território brasileiro durante o período chamado de "Anos de chumbo" da história do Brasil. Paulo relata as experiências vividas na Prainha, Abricó, Grumari e Reserva, todas praias do Rio de janeiro.
O programa "Sem censura", em 1994, convidou Paulo Pereira para participar da mesa de convidados para falar do assunto daquele momento: a proibição da prática do nudismo na praia do Abricó por um juiz de primeira instância, que chamou de ridículas as nádegas dos nudistas expostas em rede nacional nos telejornais de todas as emissoras de TV. Em outubro de 2016 Paulo revisitou o programa na sua coluna do jornal Olho NU. Você poderá ler a matéria completa e ver a participação dele no programa, em vídeo disponível no YouTube. O Vídeo gravado na época em sistema VHS diretamente da TV tem uma qualidade técnica bem sofrível, mas é o testemunho de uma época. Leia o texto e veja o vídeo, ou vice-versa.
Paulo Pereira escreveu mais de duas centenas de artigos e matérias para o jornal OLHO NU. Será impraticável relacionar todas elas aqui neste espaço. No entanto todas elas estão disponíveis para leitura a partir das edições anteriores do jornal OLHO NU. Para acessá-las basta utilizar nossa Busca Interna, digitando o que você quer encontrar dentro do jornal OLHO NU. A Busca Interna está localizada na página inicial. Para facilitar seu interesse, já colocamos o link de acesso à Busca Interna para você não perder tempo: Busca interna.
(enviado em 1/10/20)
Efetivamente, quando anotamos os vinte anos de existência histórica do “Jornal Olho Nu”, criação e direção do nobre amigo Pedro Ricardo, enfatizo que considero um privilégio participar, desde o início, dessa bela construção cultural.
Agradeço, com emoção, o reconhecimento da minha contribuição, lembrando sempre que a saga nudista-naturista do Brasil, desde 1949, não pode ser vista como uma espécie de oração sem sujeito ou como uma longa frase sem sentido, mas sim, concretamente, como uma narrativa histórica documentada, testemunhada, com registro cartorial, sem diásporas, muito distante de qualquer obra do acaso ou do oportunismo inconsequente. Um país sem memória, sem referência idônea, é um edifício frágil... É tempo de conhecimento!..
Teoria e prática, o Nudismo-Naturismo tem sido para mim uma percepção e uma vivência preciosas, sem egoísmos. Quando há tanto barulho descabido, tanta pós-verdade fragmentária, tanta falsa erudição, tanta desconstrução suicida, reconforta-me especialmente saber que tenho lutado o bom combate, procurando sempre colaborar, ainda que modestamente, para uma melhor qualidade de vida.
Naturalmente,
Paulo Pereira
Rio, 2020
(enviado em 8/10/20)
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Jornal OLHO NU - edição 239 - outubro de 2020
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