Tambaba , entre o diabo e o profundo mar azul

por Richard Pedicini

A prisão de Nelci-Rones Pereira de Sousa, diretor, ex-presidente, e dono de carteira número um da Sonata, que administra - ou agora, administrava - a praia de Tambaba, a mais famosa praia naturista do nordeste do Brasil, mostra de novo quanto naturistas são vulneráveis a este tipo de acusação, e quanto o naturismo organizado carece de preparo - e ainda mais, de vontade - de defendê-los nestas horas. 

Enquanto Rones está vendo o sol nascer quadrado, no Estado "onde o sol nasce primeiro", vamos tratar logo do "elefante na sala" - Rones é culpado de fazer e comercializar fotos pornográficas e abusar de crianças, ou não?

A imprensa mostra prisão, acusação, afirmações mirabolantes sobre evidências e vítimas. Porém, é preciso lembrar que a imprensa não procura investigar os fatos, mas somente comprovar a acusação. A acusação que sai publicada não é aquela cujos alicerces vão mais fundos, mas aquela que voa mais alto.

Os fatos, nestes reportagens, se sabe pelos buracos - quando o que sai no jornal é uma coisa diferente do que seria, caso houvesse uma acusação real e comprovada. Vamos examinar os que as reportagens afirmam, de maneira quantitativa e qualitativa.

As 500 Fotos

Quase todos as matérias falam em 500 fotos. Primeiro, o número cru. 500 fotos é 15 rolos de filme; se Rones tirasse 10 fotos por fim de semana, é um ano de fotos. A quantidade não é nenhum exagero. É até baixo: a afirmação é de "100 vítimas", e cinco fotos por sujeito não parece coerente com a tese de comercialização. 

O que são as fotos? Terra informa que:

De acordo com informações oficiais, as imagens apreendidas possuiriam "nítida conotação pornográfica", sendo que "os próprios pais permitiam que as crianças e adolescentes fossem fotografadas e o produto publicado". A suspeita é de que seja realizada a comercialização das fotos e de vídeos para sites internacionais.

O Globo fala que "mais de 100 crianças e adolescentes foram fotografados nus pelo acusado". 

Como já mostramos aqui, foto de criança nua não é crime. A Folha acabou de publicar mais uns três este domingo, ilustrando reportagem sobre pessoas que na presidência Lula subiram de pobreza para classe "C". 

A frase chave aqui é "nítida conotação pornográfica". A diferença entre "pornográfica" e "nítida conotação pornográfica", é a diferença entre uma oceano de água, e uma noção de água. Um promotor nunca, depois uma operação cinematográfica, fala "Não encontramos evidência". Ele fala de "indícios" e "conotações" e "pistas importantes que podem levar ...". E de "conotação".

A tradução de "A suspeita é" nestes casos é "Não foi comprovado". 

O Diário de Pernambuco oferece outra descrição, fala que Rones foi "...acusado de utilizar a filosofia naturista para cooptar, recrutar e fotografar crianças nuas, muitas vezes em posições sensuais."

Vamos traduzir. "Muitas vezes em posições sensuais" quer dizer, "Muitas outras vezes não, e não passava disso."

E há a afirmação de que os pais de 100 crianças permitiram as fotos. Se alguém em Paraíba queira fabricar pornô, não duvido que encontraria um ou outro pai que venderia suas filhas - a prostituição infantil é um problema lamentavelmente endêmico no país. Mas pais de 100 crianças? Numa praia com um número limitado de freqüentadores fiéis? Você acredita? 

Agora, o assunto de abuso. Lendo as matérias na Internet, há uma falta notável de afirmações das próprias crianças de que foram abusadas. Ouvimos - de novo de O Globo - de que "Testemunhas disseram ainda que os menores também eram vítimas de abusos sexuais praticados por Sousa." Que testemunhas são estas, e como eles saberiam? 

- São inúmeras as fotografias de crianças que, em tese, primeiramente eram levada para Tambaba, para se customizar a situação naturista. Depois, seguiam para a residência do investigado, onde eram fotografadas e abusadas sexualmente - salienta o promotor. (Promotor de GAECO Octávio Celso Gondim Paulo Neto)

"Em tese" é outra vez, palavra-código para "não foi comprovado". 

O Globo termina a matéria com uma das afirmações de sempre, para impor uma pátina de seriedade: "Sousa era investigado havia cinco meses."

Imagine. A policia ouve que alguém está comendo criancinhas, e deixe ela continuar durante cinco meses, e neste tempo todo, não consegue o prender em flagrante. Dá para acreditar? No caso Colina do Sol, a polícia também afirmou que estavam investigando faz seis ou oito meses, e uma leitura do inquérito mostra que isso, também, foi mentira. No caso de Rones, as reportagens dizem que ainda vão investigar se as fotos de Rones saíram em sites. Se não determinaram isso ainda, que diabos estavam fazendo durante cinco meses? 

O antipático sr. Rones

Não sei se eu cheguei a conhecer sr. Rones, quando passei em Tambaba no congresso INF-FNI em 2008, na ilusão de que entre os naturistas encontraria apoio para Dr. André Herdy. 

Sr. Rones, até onde eu sei, não fez nenhuma gesto ou palavra de apoio ao Dr. André. Além disso, ouço que ele militava contra homens solteiros e homossexuais na praia. A discriminação contra homossexuais é mais uma manifestação da intolerância ora contra judeus, bruxas, negros, anarquista, comunistas - e agora contra quem é acusado de pedofilia. Alguém que conhece bem o lugar e o homem, disse que ele constantemente fiscalizava o comportamento dos outros na praia, brigando com quem não se encaixava na sua visão rígida de naturismo. 

Não conheço Rones, pouco conheço Tambaba. Culpado ou inocente, o homem tem o direto de ser considerado inocente até julgado. A prisão na televisão, com coletivas da Promotoria, já impõe uma condenação na opinião pública que nenhum veredicto nunca vai apagar. O que foi mostrado das evidências até agora é de fragilidade extrema. Se, eventualmente, encontram provas mais robustas, pode ser que isso condene Rones - mas ainda assim, não inocenta a polícia e o GAECO de ter agido numa maneira criminal agora na prisão espetacular dele. 

Obs; o texto acima foi reduzido pela edição do jornal OLHO NU.

(enviado em 16/12/10 por Peladistas Unidos)

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