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Remédio natural

Raios solares podem ser um protetor natural contra o câncer

 

por Ingfei Chen

                    The New York Times

Tradução de Danilo Fonseca

    Contrariando as advertências repetidas com freqüência sobre o bronzeamento e o câncer de pele, alguns cientistas têm explorado uma idéia quase herética: os raios solares poderiam, na verdade, proteger o organismo contra outros tipos de câncer.

 

     A idéia não é nova; dois epidemiologistas a propuseram 22 anos atrás. A sua teoria era de que a vitamina D, que a pele produz ao ser exposta ao sol, de alguma forma previne o surgimento de células malignas. As pessoas que vivem em regiões de latitudes altas, com menos luz solar, não produzem grandes quantidades dessa vitamina e, portanto, poderiam ser mais vulneráveis aos tumores, preconiza a teoria.

 

     No início, a maior parte dos cientistas desprezou completamente tal idéia. Afinal, a vitamina D era conhecida por desempenhar um papel fundamental somente na manutenção de ossos fortes. Mas, após duas décadas de pesquisas, a possibilidade de que a substância possa ser dotada de algum poder anti-cancerígeno não parece uma teoria fantástica.


     Embora a hipótese que vincula a falta de sol e vitamina D ao câncer ainda seja controversa, alguns pesquisadores estão vendo essa vitamina como um possível remédio para a doença. Experiências clínicas em pessoas estão sendo atualmente realizadas, testando a possibilidade de que a vitamina ou compostos similares possa tratar os tumores ou aumentar a eficácia da quimioterapia.


     A luz solar fornece ao corpo cerca de 90% da vitamina D necessária. Os raios ultravioletas estimulam a pele a produzir uma forma biologicamente inerte da substância que, a seguir, é convertida em uma forma ativa, um hormônio chamado calcitriol.


     No início da última década de 20, cientistas descobriram que uma deficiência de vitamina D, devido à exposição insuficiente à luz solar, causava o raquitismo, uma doença óssea da infância. Durante décadas, os especialistas acreditaram que a principal função da vitamina seria a proteção dos ossos.

 

     Mas, em 1980, Cedric e Frank Garland, epidemiologistas e irmãos, lançaram a hipótese de que alguns cânceres seriam causados pela falta de sol e vitamina D.


     Eles perceberam que os mapas do Instituto Nacional do Câncer revelavam uma notável distribuição geográfica das mortes causadas pelo câncer de cólon: os maiores índices de morte estavam concentrados nos Estados do norte e eram cerca de três vezes mais elevados do que no sul do país.

     Mais tarde, outros cientistas sugeriram que baixos índices de vitamina D também causariam o câncer de próstata, e observaram que a doença acometia duas vezes mais os negros do que os brancos. Os negros estão menos propensos a sofrer de câncer de pele porque a epiderme escura os protege contra os
raios solares, afirma Gary Schwartz, epidemiologista da Universidade Wake Forest. Mas a pele escura, diz ele, poderia explicar os altos índices de tumores na próstata.

    

     "Se acreditarmos que os raios solares causam um tipo de câncer, então podemos usar a mesma evidência para argumentar que a luz do sol evita outros tipos da doença", diz Schwartz. Homens do Estado do Maine, no norte dos Estados Unidos, têm 50% mais chance de morrer de câncer de próstata do que os que moram na ensolarada Flórida, acrescentou.


     Estudos feitos pelos irmãos Garland, Schwartz e outros cientistas têm demonstrado desde então que pessoas que vivem em regiões relativamente privadas da luz solar, ou com baixos níveis de vitamina D aparentam correr um risco maior de desenvolver vários tipos de câncer.


     Em abril, pesquisadores do instituto do câncer relataram que as chances de morrer de câncer da mama, cólon, ovário e próstata eram reduzidas entre 10% e 27% para as pessoas que moram nas áreas ensolaradas, em relação àquelas que viviam no norte do país, com base em atestados de óbitos de 24 Estados.

     "A teoria está sendo cada vez mais consubstanciada", afirma Cedric Garland, professor de medicina da Universidade da Califórnia. Garland acredita que o simples fato de se consumir os níveis recomendados de vitamina D, 400 unidades internacionais por dia, para pessoas com mais de 50 anos, pode ajudar a prevenir o câncer. Mas ele adverte que 2.000 unidades por dia podem se constituir em uma dose tóxica.

 

     Os críticos dizem que os relatórios dos epidemiologistas não provam que uma deficiência de luz solar e vitamina D tenha causado o surgimento de tumores.


     "A evidência é provocante, mas não é conclusiva", diz Donald Trump, chefe do Instituto do Câncer Roswell Park. Os estudos baseados na observação não descartam outros fatores, como a genética e a dieta.


     "Creio que há uma pista nessas pesquisas", diz John Milner, pesquisador de nutrição do Instituto Nacional do Câncer. Mas os dados não são suficientemente persuasivos, diz ele.


     Mesmo assim, há muita evidência laboratorial de que a vitamina D possa ter um potencial para inibir o surgimento de tumores. No decorrer de pesquisas feitas nos últimos 20 anos, descobriu-se que o calcitriol
desempenha um papel importante no controle do crescimento e maturação celular -- e que as células do cólon, da próstata e dos seios possuem a proteína receptora que se liga ao calcitriol.

 

     Schwartz e os seus colegas demonstraram que as células da próstata chegam a produzir elas mesmo esse hormônio. "É o que basta para inibir o seu próprio crescimento", afirma. Enquanto os andrógenos, ou
hormônios masculinos, são o pedal do acelerador que promove o crescimento da próstata, "a vitamina D é o freio".

    Em Pratos Petri, grandes doses de vitamina D ou do hormônio calcitriol são capazes de inibir a proliferação das células cancerosas.

Alguns experimentos mais antigos também demonstraram que os compostos da vitamina D convertem células de tumores em células normais, impedem que as células malignas se disseminem e chegam mesmo a matá-las nos Pratos Petri. Estudos sugerem que esses produtos químicos também evitam o crescimento desses tumores em roedores.


     A pesquisa acendeu esperanças de que o calcitriol possa se constituir em uma potente terapia contra o câncer. Mas um grande obstáculo tem sido a segurança.


     Para alcançar as altas concentrações de vitamina D que produzem benefícios anti-câncer no laboratório, os pesquisadores pensaram que seriam necessárias doses extraordinariamente altas, diz Trump. Tais
quantidades são tóxicas, aumentando o nível de cálcio no sangue, causando vômitos, perda de peso, depósitos de cálcio e até mesmo a osteoporose.


     Mas Trump e os seus colegas de pesquisa da Universidade de Pittsburgh dizem que resolveram o problema. Em testes, eles foram capazes de administrar grandes quantidades da vitamina a pacientes de câncer apenas três vezes por semana, ou até mesmo uma dose semanal.


     Tomasz Beer, oncologista da Universidade de Ciência e Saúde do Oregon, também vem fazendo testes com doses intermitentes de calcitriol, puro ou em conjunto com outros tratamentos, contra o câncer da próstata. Em uma conferência em maio, ele e colegas apresentaram a primeira evidência clínica de que a
vitamina D poderia aumentar a eficácia da quimioterapia.


     Em um teste contínuo, 37 homens com câncer avançado de próstata receberam doses semanais de calcitriol e docetaxel, uma droga quimioterápica, durante seis de cada oito semanas. Os níveis de PSA (Antígeno Específico da Próstata) diminuíram em pelo menos a metade em 81% dos pacientes. Entre o grupo pesquisado, a doença foi controlada por um período médio de um ano. Em estudos anteriores, somente com a terapia à base de docetaxe, diz Beer, 42% apresentaram esse tipo de redução de PSA, e os tumores foram controlados por um período médio de cerca de cinco meses.


     Os benefícios excederam as expectativas, diz ele, mas eles devem ser encarados com cautela, já que o teste não contou com um grupo direto de comparação que recebesse apenas o docetaxel. O próximo passo é um grande teste clínico internacional, para o qual já se estão recrutando pacientes. Ele comparará
o tratamento conjunto do calcitriol e o docetaxel com aquele baseado somente na droga quimioterápica em 240 pacientes.


     As informações sobre o teste podem ser encontradas online no site www.novacea.com/products/ascent.
"Se o resultado do teste for negativo, as descobertas iniciais promissoras vão sumir nos ralos da história", diz Beer. "Mas, se o resultados forem positivos, contaremos com um novo e empolgante tratamento para o câncer de próstata com altos níveis de tolerância".

 

     Nesse ínterim, laboratórios de todo o mundo vêm também trabalhando para criar versões mais seguras do calcitriol que eliminem os seus efeitos tóxicos. Atualmente, os cientistas estão estudando algumas dessas substâncias parecidas com a vitamina D em pacientes de câncer. Schwartz realiza uma pesquisa com a droga Zemplar em homens com câncer de próstata em estágio avançado. Na Europa, a companhia LEO Pharma, de Copenhagen, está testando um composto, o Seocalcitol, comparando-o com um placebo, em 1.100 pacientes de câncer do fígado.

 

     "Embora as terapias baseadas na vitamina D pareçam ser promissoras, a prova de fogo será aquilo que acontecerá dentro dos próximos dez anos. Dentro de três a quatro anos os pesquisadores esperam começar a ter algumas respostas", diz Schwartz.

 

enviado por Affonso Alles, presidente da AGAL

(Associação Amigos da Galheta).

a.alles@uol.com.br

 

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