CONSIDERAÇÕES SOBRE O ESTAR NU OU PELADO*
por Jorge Bandeira**
Manaus, Amazonas, 4 de janeiro de 2004
Os termos nu e pelado são comuns
para quem vive o naturismo, e também são palavras que habitam o imaginário e o
vocabulário do brasileiro. Poderíamos pensar um pouco mais profundamente sobre
estas duas palavras, evitando os lugares comuns de que são alvos, nesta
sociedade tão afeita a julgamentos precipitados em relação a pratica do nudismo
ou naturismo?
Bem,
vejamos o que nos informa o famoso “dicionário Aurélio”. A palavra NU tem
origem no latim NUDUS, que significava naquela língua “morta”, sem vestes,
roupas, assim como despojado e destituído de algo. A palavra pelado, pelo seu
significado correto, se origina do pelar, que num primeiro significado
remeteria a tirar o pêlo, incluindo os cabelos, e, numa segunda variante, tirar
a pele ou a casca de algo, pelar.
Por
estes dois significados existem grandes diferenças entre o NU e o PELADO. O nu,
por esta ótica, seria a extirpação ou retirada de algo que necessariamente não
faria parte de nossa natureza, algo do exterior, de fora do nosso corpo, que
também poderia nos colocar na condição de recuperarmos nossas formas originais,
a nossa primeira e original maneira de estar no mundo. O nu seria o ser humano
integral, sem fachadas, protegido apenas pelo seu corpo.
O
PELADO, ao contrário, nos coloca uma outra posição de interpretação do termo, a
partir de sua etimologia (origem e significado da palavra). Extirpando os pêlos
ou mesmo a própria pele (nos pelando), estamos privando nosso corpo de algo que
pertencia a ele, de nossa constituição física, de um detalhe que nos acompanha
desde nossa aparição no mundo. Só que do cabelo (corte do pêlo) à pele (tirar a
pele, pelar-se) existe um grande caminho a ser percorrido. De toda maneira,
claro está que do NU ao PELADO estamos numa trajetória que começa no exterior
do corpo (a nudez) ao seu interior, de um adereço chamado de roupa à nossa
carcaça natural (a pele). Tudo isso nos faz refletir sobre a dimensão cultural
que envolve a observação dos corpos no mundo. Para os que não são
verdadeiramente naturistas continua sendo um tabu a nudez total, pois não
conseguem pensar neste corpo nu sem relacioná-lo ao prazer, ao pornográfico e
ao sexual, todos juntos, de forma confusa, em suas visões estreitas da nudez,
eliminando as diferenças físicas e as individualidades, aliados ao falso
moralismo de muitos “puristas”. O corpo, portanto, apesar dos brilhantes
esforços dos nudistas/naturistas em modificar as posições conservadoras em
relação à nudez total e natural, continua sendo vigiado e punido, como nos
mostrou o filósofo Michel Foucault, um dos defensores da liberdade de
pensamento e da ação do indivíduo. Para nós, naturistas, resta continuarmos com
nossa bandeira principal, qual seja, conscientizar que, nus ou pelados, o
pecado, para o naturismo, é um conceito que urge ser reavaliado, caso
contrário, estaremos todos perdidos no inferno da ignorância.
* Texto elaborado após refletir sobre material
escrito pelo professor Paulo Menezes na revista sexta-feira (Antropologia,
Artes, Humanidades) número 4.
** Historiador, especialista em História Social
da Amazônia.
jotabandeira@yahoo.com.br
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