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Jornal Olho nu - edição N°39 - dezembro de 2003 | |
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Jornal Olho nu - edição N°45 - junho de 2004
Esboços do Nu Naturista no Modernismo Brasileiro por B. Dean Willis*
A imagem do corpo nu aparece bastante freqüentemente na literatura
universal, usualmente na literatura erótica. Porém o nu literário às vezes
retrata-se num contexto natural, favorável aos objetivos da filosofia
naturista. O seguinte são idéias referentes a alguns exemplos do nu
naturista num contexto especificamente brasileiro: o modernismo. Eis o "erro
de português" de Oswald de Andrade:
Já no começo do
modernismo, no esforço de revalorizar a autêntica cultura brasileira, Oswald
apontou para o aspecto positivo do nu, porém um nu potencial, não realizado
no desigual intercâmbio das tradições. Nestes versos o clima parece ser o
único fator decisivo na luta da roupa, mas como sabemos, na realidade a
religião e os costumes europeus foram as causas da abolição da prática
indígena de andar despido. Em mais um poema, "as meninas da gare," Oswald
volta a este momento inicial de contato entre culturas para desenvolver o
efeito da nudez natural dos indígenas sobre os europeus. Os versos questionam jocosamente o preconceito importado da vergonha: As "vergonhas" expostas aqui curiosamente negam, dentro dos mesmos versos, a possibilidade da "vergonha" católica na que foram criados os colonizadores. Desajeitavelmente não foi possível a inteira erradicação deste conceito do pecado original, mesmo que alguns poucos europeus adotaram o estilo naturista dos povos autóctones. Tanto na poesia quanto nos manifestos "Pau-Brasil" e "Antropofagia" de Oswald, a nudez forma parte da cosmovisão indígena revalorizada pelos autores e artistas do movimento modernista.
Mário de Andrade também utiliza o nu naturista para afirmar o caráter pluricultural do povo brasileiro. Na sua rapsódia Macunaíma, o protagonista (que quase não fala) e os dois irmãos dele saem do banho que tomaram na marca do pezão de São Tomé, transformados nos fenótipos característicos do país: branco, vermelho e negro: "E estava lindíssimo na Sol da lapa os três manos um louro um vermelho outro negro, de pé bem erguidos e nus. Todos os seres do mato espiavam assombrados." Altamente representativa da origem natural do país, a fauna indígena aparece numa lista que faz Mário de nomes e variedades das espécies e dos ruídos que faz cada uma. Os animais "assombrados" começam fazer barulho até que Macunaíma "botou as mãos nas ancas e gritou pra natureza: ─Nunca viu não! Então os seres naturais debandaram vivendo e os três manos seguiram caminho outra vez." Somente depois deste batismo (que é também metamorfose e renascimento) acompanhado pelos irmãos nus, fenotipicamente diversos, e pela "fala" natural dos animais do mato, Macunaíma vai começar falar com verdadeiro sotaque e vocabulário brasileiros. Nesta cena, e também na exagerada cerimônia macumbeira num capítulo posterior, a nudez é condição imprescindível para a aproximação à essência puramente brasileira. De maneira semelhante, as famosas imagens da Tarsila do Amaral, como A Negra e Abaporu, realçam a importância que deram os modernistas ao nu como expressão autêntica. Nestas imagens o corpo é muitas vezes exagerada, favorecendo certa parte deformada, num intento de estender, de esse jeito emblemático, os limites da representação corpórea do país. O corpo nu foi para os modernistas um conceito atávico, ideal para encarnar a liberdade artística da criação duma nova e orgulhosa identidade nacional. *B. Dean Willis |